quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O direito de ser imbecil

Guindaste não teria suportado o próprio peso e caiu sobre
 parte do estádio corintiano (imagem: AE)
Tragédias como a de hoje, nas obras do estádio do Corinthians, mostram como o ser humano pode ser boçal. Não há limites para  a pequenez de espírito quando a falta de humanidade, de valores, é demonstrada dia após dia. É só aparecer a oportunidade.

Alguns se apegam a causas, que defendem com a própria vida, se for o caso. Outros, os desprovidos de bom-senso, limitam-se a agir feito hienas à espreita de carniça. Se arvoram quando têm a chance a sua frente ou no ecrã do computador.

As redes sociais deram voz a quem não tinha, mas, como contra-indicação, espaço a imbecis, a poltrões que falam de tudo, mesmo não tendo base para falar de nada, a não ser da própria inutilidade. No esquema tático da humanidade, estes não servem nem para compor elenco. 

São bufões que desopilam o fígado em nome de uma rivalidade burra, assim como eles. Não enxergam um palmo diante do próprio focinho e gostam de fazer troça de tudo.

Todos têm direito à imbecilidade, mas alguns exageram ao fazê-lo valer.  

sábado, 16 de novembro de 2013

O caminho das Índias

O relógio já avizinhava os 10 minutos finais da segunda parte, no estádio da Luz. O jogo caminhava para um, se não desastroso, ruim empate sem gols entre Portugal e Suécia, na primeira ronda da repescagem europeia para a Copa de 2014, que será aqui, nos superfaturados gramados tupiniquins, quando Miguel Veloso recebeu de Fabio Coentrão e jogou na área. Lá estava Cristiano Ronaldo, que vinha cumprindo uma partida absolutamente insossa, tendo aparecido somente na falta tola sobre o guardarredes sueco, Isaksson, que lhe rendeu uma cartolina amarela, e uma cabeçada bem sutil contra um adversário. O capitão português atirou-se à bola e, quase ao rés-do-chão, venceu o arqueiro e marcou, de cabeça, o golo solitário da partida.

No entanto, para chegar ao porto seguro, o mister Paulo Bento terá que corrigir o péssimo rendimento ofensivo dos trincos portugueses. Miguel Veloso e Raul Meireles houveram-se bem na marcação, mas quando precisaram dar aporte a João Moutinho, o que se viu foi um festival de lançamentos para a área sueca. Todos, invariavelmente, pararam nas mãos do goleiro ou foram rechaçadas pelos zagueiros. Ronaldo, aberto e isolado pela esquerda, limitava-se a trombar com os marcadores.

A defesa, pouco protegida pelos volantes, só não teve problemas porque Ibrahimovic não foi sequer sombra do jogador que vive uma temporada estupenda sob a camisola do novo-rico PSG. Ele foi notado somente no corta-luz que deu para a conclusão de Larsson, esse sim, ao lado de Elmander, um tormento aos mais de 60 mil lusos que lotaram a Catedral da Luz.

BEM-VINDO À SELVA Bem marcado, Ibrahimovic
não causou problemas à zaga lusa (EFE/EPA/Tiago Petinga)

O problema só foi solucionado quando Moutinho veio ter à altura do grande círculo iniciar ele mesmo as tramas ofensivas, com o apoio dos excelentes alas Fabio Coentrão, à esquerda, e João Pereira, do outro lado. Com as linhas avançadas e a equipa compactada, a bola parou de ser rifada e passou a rodar, perto da área, como se deve fazer quando se enfrenta um sistema defensivo cerrado como o sueco. Ainda assim, será preciso ter uma defesa mais consistente, posto que os suecos não se contentarão em terminar o jogo com 37% de posse de bola.

Talvez esse expediente seja desnecessário no jogo da volta, quando a Suécia sairá para o jogo e, por certo, terá que se preocupar com um craque inquestionável que vive uma fase exuberante e que decide os jogos mesmo quando não faz um jogo à altura de si. Dois minutos depois de ter aberto o escore na casa benfiquista, em outra bola alçada na área, dessa vez pelo alto, o Puto Maravilha subiu de cabeça para mandá-la à barra sueca. Esta não entrou, mas serviu de aviso para os suecos (e alento para os lusos): Portugal está vivo e muito disposto a refazer o caminho das Índias 514 anos depois. E o capitão da nau lusitana conhece o caminho. 
EU ESTOU AQUI! Cristiano Ronaldo mostra
 quem manda na disputa pela vaga (Reuters)

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Vitórias, títulos e ingratidão

por Vinicius Carrilho*

Foram três anos, cinco títulos e o nome gravado na história do Sport Club Corinthians Paulista para sempre. Assim podemos resumir a segunda vez em que os caminhos do alvinegro e de Tite se cruzaram. Neste período, o clube mudou, o técnico mudou, mas o mundo do futebol permaneceu o mesmo: completamente ingrato.

Certa vez, Machado de Assis disse que “a ingratidão é um direito do qual não se deve fazer uso” e, neste caso, o Corinthians fez uso desse direito completamente imoral. Aliás, não só o Corinthians, parte de sua fiel torcida – cada vez menos maloqueira e sofredora, e mais de sofá – também.

É verdade que Tite não teve uma grande temporada em 2013 (apesar de um segundo semestre espetacular em 2011 e um ano estupendo de 2012), assim como também era notório que seu ciclo parecia estar no fim. Porém, a forma como o treinador deixa o clube é melancólica. Como um fantoche, ele ficará fazendo cena no banco de reservas até dezembro, quando, por decisão da cúpula corinthiana, cederá sua vaga para Mano Menezes.

Não há nada de ilegal no que fez o Corinthians, mas Tite merecia mais respeito. Sai do clube como se sua passagem tivesse sido comum, quando, na verdade, o treinador se aproximou muito – se não passou a ser – do título de maior técnico dos 103 anos de história.

Diz-se por aí que o pensamento no futebol, para o torcedor, tem validade definida a cada quarta e domingo. A sabedoria popular, em 2013, foi confirmada por boa parte da torcida do Corinthians, criando o mais triste dos capítulos deste fim de ciclo. Após conduzir o time no ano mais vitorioso de sua história, alguns dos torcedores – aqueles que sabem tanto de futebol que devem ter inventado o esporte – passaram a considerar Tite fraco, retranqueiro e chegaram ao absurdo de atribuir tudo que tivera conquistado a um único fator: sorte.

Enquanto alguns atletas – que, alias, poderiam criar uma nova categoria promocional de operadores de telefone: a promoção dos créditos eternos – eram claramente blindados, Tite recebia, calado, as mais diversas críticas. E assim passou 2013.

Se faltou gratidão no lado alvinegro, sobrou em Adenor. Em entrevista no Couto Pereira, ele disse: “Alguns clubes me ligaram, eu disse não. Só no Corinthians tenho condição de dar continuidade ao trabalho. Se não ocorrer, vou estudar um pouco, curtir a família, reciclar, assistir a jogos, ir para Caxias do Sul ver minha mãe e cuidar da saúde dela”, depois, completou: “Só quero me ater a uma coisa. Não sei qual é o futuro, mas o que foi construído por todos nesses três anos de Corinthians nenhuma equipe do futebol mundial construiu. Ninguém construiu tamanhas conquistas em três anos. Isso é significativo, ninguém vai tirar de nós. Quero guardar isso para o resto da minha vida”.

Nesta quinta-feira (14), dia em que supostamente foi informado de sua dispensa, Tite comandou o treino dos reservas e apenas limitou-se a dizer aos jornalistas presentes: “Estou em paz. Estou em paz comigo mesmo!”. E assim mesmo deve ficar. Ele deixa não só seu nome na história, nem unicamente a imagem de que um técnico preparado naturalmente torna-se vencedor. Adenor Leonardo Bacchi sai do Corinthians deixando claro que, apesar deste meio podre que é o mundo da bola, ainda há quem possa prosperar com caráter.

Agora, resta apenas a torcida que faça sua parte. Dia 01 de dezembro de 2013, no Estádio do Pacaembu, o Corinthians faz seu último jogo em casa com Tite no banco de reservas. Mais do que tudo, é uma obrigação que todos os presentes façam desta partida uma grande despedida. É o mínimo que se espera para a ocasião. Absolutamente todos devem reverenciar Adenor Leonardo Bacchi, até mesmo se for algo falso. Até porque, como cantava Antônio Marcos:

“Ah, o mundo sempre foi
Um circo sem igual
Onde todos representam
Bem ou mal
Onde a farsa de um palhaço
É natural"

* Vinicius Carrilho tem 22 anos, é jornalista, 
morador de Osasco e gostaria de ganhar a vida 
fazendo humor, mas escreve melhor do que conta piadas.