sábado, 10 de janeiro de 2015

Matamos

Por Leandro Marçal*

Matamos porque roubamos. Matamos porque reagiram. Matamos porque não reagiram. Matamos porque eles não tinham. 

Matamos porque torcemos. Matamos porque eles torcem. Matamos porque não torcemos pelos mesmos. Matamos porque brigamos.

Matamos porque policiamos, servimos e protegemos.

Matamos porque governamos, matamos porque temos poder, matamos porque corrompemos.

Matamos porque cremos. Matamos porque eles creem. Matamos porque eles não creem. Matamos porque eles creem diferente de nós.

Matamos porque discutimos, porque passamos do ponto, porque dirigimos e não levamos desaforo pra casa.

Matamos porque odiamos.

Ah, às vezes matamos até quando amamos.

Matamos enquanto trabalhamos, enquanto estudamos, enquanto nos divertimos, enquanto bebemos, no momento em que nos drogamos.
Matamos porque negligenciamos.

Matamos porque queremos, porque podemos.

Principalmente porque não pensamos.

Mais ainda porque não somos humanos.

Matamos porque...

Matamos por quê?

Matamos por quem?

Matamos até quando?

*Leandro Marçal é um jornalista de 23 anos, torce pelo tricolor paulista
 e por um mundo menos hipócrita e com mais bom humor.
E, apesar do nome de sambista, é incapaz de tocar um reco-reco.
Ainda assim, é o Rei da Noite de São Vicente.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

O suicídio do Jornalismo

Capa do jornal carioca do dia 09 de janeiro.
Periódico cortou 160 pessoas, 30 delas da redação

No mesmo dia em que O Globo chamou o abominável ataque aoCharlie Hebdo de "ataque à liberdade de expressão", anunciou a demissão de 160 pessoas do seu quadro de colaboradores. O Estado de Minas também ceifou dez profissionais. A editora Abril fecha revistas e entrega parte da sede.

Não foi o ataque extremista em Paris que feriu o Jornalismo, mas ele próprio se mutila dia a dia. Quando faz coberturas superficiais, o Jornalismo morre um pouco; quando aceita a pressão de grupos políticos ou anunciantes, o Jornalismo morre um pouco.

O jornalista Jorge Kajuru, que perdeu o emprego na Band por ter feito críticas
ao governo de Minas Gerais às vésperas de um Brasil x Argentina, em 2004
Quando entretém em vez de informar, o Jornalismo morre um pouco; quando um veículo cria um título dúbio para obter mais acessos, o Jornalismo morre um pouco. 

Quando o jornalista mostra-se preconceituoso, o Jornalismo morre um pouco; quando o aspirante a foca entra na faculdade para fazer o curso só porque gosta de futebol, o Jornalismo agoniza.

O Jornalismo de verdade, não essa coisa que é praticada por aí, dá voz a quem não tem; dá vez a quem dela precisa; é instrumento de justiça, não da justiça ou de justiçamento; é o enfrentamento da censura de onde quer que ela venha. É sacerdócio. É renúncia. É praticamente um franciscanismo, um voto de pobreza no qual se despe da vaidade pessoal pelo bem coletivo.

O Jornalismo morre porque nos falta paixão e nos sobra vaidade. O Jornalismo morre porque não damos a ele a importância que deveria ter, tampouco a dignidade que merece. Uma pátria que se diz educadora, mas não respeita seus professores, está doente, definha. E o Jornalismo sucumbe com ela.