quinta-feira, 25 de março de 2010

A fase de Messi

* Por Humberto Pereira da Silva

Messi está bem, muito bem. Nos últimos três jogos - Valência, Stuttgart e Zaragoça -, esteve explêndido; foram três jogos como há muito não se via individualmente: lembro de Ronaldo, o Fenômeno, e de Ronaldinho, ambos pelo mesmo Barcelona. As comparações, depois do que fez coçam e coçam nos quatro cantos. E é com elas, justamente, que Messi tem os grandes desafios, como ele mesmo constatou em entrevista: "para ser uma lenda tem que ganhar uma Copa de Mundo". É o que separa, para mim, "nossos" dois Ronaldos. Outro ponto, mera coincidência, mas que creio deva perturbar o argentino: três momentos mágicos na história recente do futebol pelo mesmo clube, o Barcelona. A coincidência, no caso, joga contra Messi. Logo após temporadas mágicas no Barça, "nossos" Ronaldos não repetiram em 98 e 2006, respectivamente, as expectativas que deles se formaram numa Copa do Mundo.

Num primeiro momento, jogo de coincidências, comparações e espectativas.Li, já, que o prêmio de melhor do mundo desse ano estará condicionado pela Copa do Mundo. Pensemos com calma. O prêmio de melhor do mundo tem sido entregue ao grande jogador da Copa, desde que foi instituído: Romário (94), Zidane (98), Ronaldo (2002), Canavarro (2006). Mas é certo também que Ronaldo, eleito em 96, não ganhou nada com o Barça, o mesmo suscedendo com Zidane em 2003. A eleição de Cannavaro em 2006 pode ser assim creditada: não tem tu, vai tu mesmo.

A situação agora de Messi, em relação aos jogadores aqui lembrados, apresenta algumas particularidades. Desde que Ronaldinho foi eleito melhor do mundo pela Fifa em 2004, a eleição tem sido pontuada pela conquista de título importante na temporada. É o que explica a eleição de Cannavaro. Mas, mais que qualquer coisa, para mim o que está em jogo nesse ano é a credibilidade da própria eleição. Lembrar que a eleição de melhor da Copa já rendeu controvérsias e perda de credibilidade: Ronaldo, melhor da Copa de 98 e Oliver Kahn, melhor em 2002. Não creio, estou praticamente certo de que outro jogador no futebol atual não fará o que Messi fez na temporada atual. Assim como muitos creem, um fiásco de Messi na Copa e ele não teria novamente o título de melhor do mundo no final do ano pela Fifa.

Mas, eis a peculiaridade de Messi na temporada atual: quem seriam os candidatos para fazer numa Copa o que ele fez no Barça? Os nomes são por demais conhecidos: Rooney, Kaká e C. Ronaldo. Alguém mais? Um Cannavaro como zebra? E esse é o ponto em que a credibilidade da eleção da Fifa fica em xeque. Qualquer outro, além desses, que for eleito pelo que fizer na Copa, com certeza não o fará com o brilho que Messi e esses têm tido nas temporadas recentes. A eleição da Fifa, como qualquer eleição, diga-se, perderia completamente o sentido.

Agora vejamos as coisas com esses quatro grandes jogadores da atualidade. Para a eleição da Fifa fingir credibilidade só Rooney estaria creditado para a eleição do final do ano. Mas Rooney e Messi,a se levar em conta conquistas, estão em posição bastante similar: grandes chances de levar a Copa dos Campeões, mas igualmente grandes chances de malograrem na Africa do Sul, pois entendo que Inglaterra e Argentina têm chances iguais; de qualquer modo, se nenhum dos dois conquistar sequer a Europa. 

Quanto a Ronaldo e Kaká, é aqui que também se pode destacar a peculiaridade com que Messi se encontra. Cristiano está bem e, contra Messi, pode levar o Espanhol. Mas precisaria fazer muito na Copa por Portugal e, no que não acredito, na Copa teria no mínimo que reviver Eusébio em 66. Kaká é o nó mais estranho a se desatar. Tem tido pelo Real uma temporada pífia, com problemas de toda sorte, mas dos quatro, com o Brasil, é o que tem maiores chances de mostrar seu brilho na Copa. Como em 2007, quando fez uma brilhante Copa dos Campeões pelo Milan, poderia novamente ser eleito pela Fifa. Mas isso só reafirmaria o que já na eleição de 2007 me pareceu injusto: eleger um jogador que ao longo da temporada não reeditou grandes atuações e que numa situação específica favorável se deu bem. Para mim o melhor de 2007 foi C. Ronaldo.

A situação de Messi no ano, portanto, não é a mesma em que se encontravam os Ronaldos e mesmo Zidane anos atrás. Numa previsão meio que fora de hora, são muito, muito grandes as chances de nenhum dos quatro fazer uma boa Copa do Mundo. Aí, se Messi não for eleito no final do ano a eleição da Fifa seria uma igualmente grande piada. Não se justificaria um novo Canavarro: se não tem tu, tem Messi, sim.

Outra coisa bem diferente é se Messi ficará entre os maiores da história. Isso é cedo para dizer, como o provou Ronaldinho Gaúcho em 2006. Para ficar com a própria ressalva de Messi em relação o que já fez, "para ser lenda, tem que ganhar uma Copa do Mundo" e, desde Maradona, surgiram só duas lendas: Zinedine Zidane e Ronaldo Nazário de Lima. O resto? Jogadores magníficos, não mais que isso.

*Humberto Pereira da Silva, 46 anos, é professor
universítário de Filosofia e Sociologia e crítico de 
cultura de diversos órgãos de imprensa

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