domingo, 22 de junho de 2014

O declínio do futebol “africano”?

Por Humberto Pereira da Silva*

Primeiro, o futebol praticado por seleções africanas. Nessa Copa, cinco representam o continente: Argélia, Camarões, Gana, Costa do Marfim e Nigéria. A primeira rodada não foi nada favorável a essas seleções. Já a segunda, mudou de figura. O continente corre o risco de ter até três seleções nas oitavas de final.

O futebol praticado do continente africano, com ocasionais participações em copas do mundo de África do Sul, Tunísia e Egito, é dominado por essas seleções. Mas quando se fala em futebol “africano”, inadvertidamente se toma o todo pela parte, como se a Nigéria, por exemplo, fosse o continente, não o contido.

Mas, então, por que declínio? E o que isso tem a ver com a relação entre o todo e a parte?Até a Copa de 1990, o futebol praticado fora da Europa e América do Sul, exceção a México, praticamente era ignorado, mera figuração. Justamente em 1990, na Itália, Camarões vendeu caro a eliminação nas quartas de final para a Inglaterra: perdeu de 3x2 na prorrogação.

Acreditou-se numa evolução do futebol praticado no continente. A Nigéria despontou em seguida, mas não foi mais longe que Camarões. E assim, em 2010, na primeira Copa disputada na África, Gana repetiu a situação de Camarões e foi eliminada nas quartas de final pelo Uruguai, nos pênaltis, num jogo para lá de dramático.

Ocorre que, passados vinte e quatro anos da Copa de 90, apesar de poder ter três seleções nas oitavas de final dessa Copa de 2014, poucos apostam que, agora, uma seleção “africana” finalmente chegará a uma semifinal. A evolução que muitos esperavam não ocorreu. Mesmo as que passem para a próxima fase, caso alguma se classifique, jogarão sob suspeita.

De fato, o futebol praticado por seleções africanas não vingou. Para isso, algumas... suspeitas. A primeira, e talvez mais notória, é aquela que decorre de se tomar o todo pela parte. Futebol “africano”? Ora, futebol camaronês, ou nigeriano, assim ficaria mais fácil.

Mas, o que é Camarões ou Nigéria num continente em que não há unidade de nação? Num continente cujas fronteiras dos países foram traçadas com régua pelas potências colonialistas europeias no século XIX?

Não há então, no mesmo sentido em que pensamos Itália e Alemanha, Camarões, Nigéria ou Gana e sim um punhado de jogadores talentosos que saíram desses países, foram para a Europa, onde se consagraram, e depois retornaram, se reuniram com outros que nasceram nas mesmas fronteiras para disputar uma Copa do Mundo.

Não há, portanto, declínio do futebol “africano”, simplesmente porque, apesar da crença numa evolução, nunca houve uma seleção, uma escola de futebol praticada num país africano. Questões de natureza extra-campo impedem que se forme uma escola, que o futebol praticado por seleções da África vá além do encontro de um punhado jogadores talentosos ao lado de semi-amadores.

É o que se vê em Gana, Costa do Marfim ou Nigéria. Talentos individuais dessas seleções, em razão de circunstâncias e situações improváveis numa Copa do Mundo, podem levar uma delas a uma semifinal; sendo mais otimista, a uma final. Mas isso não significa evolução ou declínio, pois não há no continente africano o sentido de nação que se forjou na Europa.

O futebol praticado por jogadores de qualquer país da África, para o imaginário ocidental, permanecerá sendo futebol “africano”. Mas um país, uma seleção desse continente que eventualmente chegue a uma semifinal de Copa do Mundo, pode deixar de existir de uma hora para outra.

Em 1974, na Copa da Alemanha, o Brasil venceu o Zaire por 3x0. O que era o Zaire, hoje é a República Democrática do Congo.

PS – No Oriente Médio não se pode falar em nação no mesmo sentido que na Europa. Mas também o futebol praticado no Oriente Médio não gerou expectativa de evolução como o praticado na África.

*Humberto Pereira da Silva, 50 anos, é professor 
universítário de Filosofia e Sociologia e crítico de
cultura de diversos órgãos de imprensa.

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