Quando o Benfica caiu para o PAOK na eliminatória para a Liga dos Campeões, uma certeza pairou sobre as cabeças inchadas encarnadas: seria preciso fazer dinheiro. E a melhor forma, se não a única, de se fazer dinheiro no futebol para tapar um buraco inesperado é vendendo. Era bonito imaginar que a solução seria fazer caixa com os excedentários, mas como é que se valoriza quem não tem lugar no seu próprio clube?
Não há mágica no futebol. Nestes momentos, é preciso vender o que tiver de mais valioso para fazer frente às despesas. No caso do Benfica, apenas um jogador tinha todas as características que o mercado das grandes ligas quer: idade e margem para progredir, atuar em alto nível e um preço barateado pela necessidade do vendedor ser maior que a do comprador: Rúben Dias.
Único titular indiscutível da Seleção Portuguesa a andar com a águia ao peito, já era esperado que, cedo ou tarde, Rúben seria recrutado para uma liga mais poderosa que a portuguesa, mero entreposto para campeonatos com clubes de maior poder aquisitivo. Pior para o Benfica que a falta dos esperados milhões da Liga dos Campeões praticamente tenha anulado a capacidade negocial encarnada, tanto que, incluído Otamendi por €15 milhões, na prática as Águias venderam-no por €53 milhões, valor bem abaixo do que se esperava e que, sem o inflacionado argentino, deveria causar embaraços à direção benfiquista a poucos dias das eleições. Fora essa questão, porém, não se pode tratar disso com espanto.
Por mais que faça falta a imagem do zagueiro firme, anímico, que nasceu para ser um capitão que independe de andar com uma tarja ao braço para sê-lo, o outro que vem no negócio, Otamendi, preenche também estes aspectos de postura que toda equipa deve ter - e que os adeptos praticamente tratam como fetiche quando quem os reúne é de casa. Neste caso, há até um ganho, dependendo dos olhos de quem vê. Internacional argentino, Otamendi já conhece o futebol português e tem uma rodagem que, obviamente, Rúben Dias jamais teria somente a jogar no Benfica, a não ser que a fasquia de suas atuações não fosse tão alta, o que faria desnecessárias análises como esta.
Rúben apresenta problemas que somente o tempo e a prática no mais alto rendimento irão corrigir, sobretudo nos jogos maiores. Somente na Seleção Portuguesa é que ele sempre apresentou o futebol que justificasse um investimento maior do que o feito pelo City e que era esperado antes da pandemia pelo presidente Vieira, que garantia ter conversas para abrir mão dele - e de Carlos Vinícius - por valores a rondarem os €100 milhões da multa. E, sabe-se, não é com a Federação Portuguesa de Futebol que se negoceia, é com o Benfica, e todo o entorno entra na conta.
Do lado prático, ao Benfica, seja qual for o defensor a preencher a lacuna do último titular produzido na Caixa Futebol Campus, cabe confiar na capacidade de Jorge Jesus para adaptar a forma de jogar sem ter o primeiro pé que construía as jogadas, lá de trás. . No mais, que se dê valor ao terreno percorrido por Rúben Dias desde os primeiros chutes, com 12 anos de idade, há 11 anos.
Queira ou não o torcedor encarnado, três temporadas a titular, uma Copa do Mundo no currículo, um título nacional e a ida para um dos grandes tubarões do futebol mundial é um percurso que nem todo grande jogador feito em casa cumpre por aí. Lembrem-se dos seus novos companheiros de clube, Bernardo Silva e João Cancelo, que mal frequentaram o balneário principal da Luz e que viveram todos os seus grandes dias na carreira a defender outro distintivo.
Convenhamos: até que durou bastante.
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