O que começou com uma pequena decepção ao ver a Selecção das Cinco Quinas toda de vermelho, terminou com a afirmação, como se precisasse, do tamanho do mito Cristiano Ronaldo. Não foi desta vez que o clássico equipamento dos calções verdes e camisolas vermelhas retornou. Da mesma forma, não vimos, em pleno, os quatro ases lusos juntos, já que Bernardo Silva saiu machucado antes dos 25 minutos.
Não houve o mesmo futebol apresentado contra a Croácia porque Jan Andersson armou seu time com duas linhas de quatro muito próximas, eliminando o espaço na frente da área onde praticamente todo time português brincou de jogar bola contra os vice-campeões do mundo. Assim, Portugal tinha que buscar espaço onde tivesse, e normalmente havia nos corredores laterais. Sem um 9 fixo, porém, foram poucas as vezes em que a bola entrou na área de Olsen.
O comando de ataque, inclusive, era uma das questões que estavam em suspenso até a bola rolar. Com Cristiano de volta, como seria o aproveitamento de João Félix? Voltaria a jogar aberto, como já fez ao lado de CR7, ou teria a mobilidade que teve na estreia da Liga das Nações? A resposta foi a melhor possível, mesmo quando Bernardo deu lugar a Gonçalo Guedes. Félix estava no centro quando roubou a bola no lance do gol 100. Foi ele, também, aberto na esquerda, que deu o passe para Cristiano definir o placar. Pouco antes, na bola na barra que Bruno Fernandes chutou, foi Gonçalo a estar na esquerda.
Também no meio, a solução passou pela mobilidade. Bruno Fernandes desceu à intermediária para ajudar João Moutinho na missão de achar passes quebradores de linha. E foi assim que começou o duelo entre Olsen e Cristiano Ronaldo, que seria o grande vencedor da noite com dois golaços, daqueles que figurarão em qualquer lista dos tentos mais bonitos dele a serviço das Quinas.
O trabalho foi facilitado, é verdade, quando o atabalhoado Svensson acertou Moutinho na entrada da área e recebeu seu segundo amarelo. A partir daí, não bastasse o histórico golaço do gênio da Ilha da Madeira, o time sueco desmoronou e houve somente um time no campo da Friends Arena, que poderia ser chamada também de Arena Cristiano Ronaldo.
Mas as sensações foram agridoces: o incômodo, com um a mais, pelo preciosismo dos lusos, sobretudo na fabulosa linha de frente, deu lugar ao deleite de ver a História sendo escrita com letras doiradas a partir do pé direito de Cristiano. O segundo, assistido por um cada vez mais maduro João Félix, foi um arco com classe e rapidez, como antevendo o desfecho do lance antes mesmo de ele existir, num jogo em que, pela superioridade numérica, 2 a 0 saiu quase de graça no palco onde Cristiano Ronaldo habitou-se a ser eterno.
Se Fernando Santos descobriu como fazer render tanto talento junto, talvez como nunca houve mas terras de Camões, agora cabe a ele manter os pezinhos lusos na relva. Com as opções que tem, Portugal pode sim sonhar em expandir seu domínio europeu ao restante do mundo, porém, fica o alerta de que, desde a Olimpíada de 1928, sempre que se sentiu confortável demais, a vaca portuguesa deitou.
Anthony Lopes: pode contar aos filhos e netos que esteve em campo no golo 100 de Ronaldo. Talvez seja sua única lembrança;
João Cancelo: não jogou tanto, mas estava em campo no golo 100 de Ronaldo;
Pepe: esteve em campo no jogo do golo 100 de Ronaldo;
Rúben Dias: esteve em campo no golo 100 de Ronaldo;
Raphaël Guerreiro: esteve em campo no golo 100 de Ronaldo. E jogou muito;
Danilo Pereira: esteve em campo no golo 100 de Ronaldo;
João Moutinho: melhor a cada dia no sistema de jogo da equipa de todos nós. É o dínamo do time, e, o mais importante: esteve em campo no golo 100 de Ronaldo. Ainda pode puxar dos galões de quem sofreu a falta que resultou no golo (Rúben Neves: entrou para aumentar o poder de marcação - e para estar em campo no jogo do golo 100 de Ronaldo);
Bruno Fernandes: a cada jogo que passa, torna-se mais relevante. Para completar, esteve em campo no golo 100 de Ronaldo;
Bernardo Silva: a lamentar, mais que a lesão, foi o fato de não estar em campo no golo 100 de Ronaldo (Gonçalo Guedes: troca-se um gajo do Seixal por outro criado no Seixal. Não tem como dar errado. Além do mais, o herói da Liga das Nações recebeu seu prêmio, que foi estar em campo no golo 100 de Ronaldo);
João Félix: contava quatro anos de idade quando CR7 marcou, contra a Grécia, seu primeiro gol pela Selecção, na abertura da Euro 2004. Porém, o entendimento foi tão grande entre eles que parecia que jogavam juntos desde então. Isso é quase tão importante quanto estar em campo no golo 100 de Ronaldo;
Cristiano Ronaldo: 101. Nada mais é preciso (Diogo Jota: substituiu o cara que tinha acabado de fazer história. Nada mau);
Fernando Santos: fez da seleção difícil de ser vencida uma equipa que encontra soluções com o que tem em campo. Mais que isso, é o técnico do jogo do golo 100 de Ronaldo;
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