“Um jogo muito positivo para a nossa preparação”. Eis a definição de Roberto Martinez na coletiva de pós-jogo do Portugal 1 a 2 Croácia. O mister está a ver o copo meio cheio. Eu vejo o copo rachado. Principalmente se o este for usado como foi e contra quem foi.
A Croácia, desde que o mundo é mundo, tem um time talhado a ter a bola no pé e fazer o tempo correr mais devagar quando a tem para si. Modric, Kovacevic, Brozovic. Todos com talento para fazer o jogo andar em ritmo lento, e quem quiser que corra. Já Portugal se apresentou, creio eu, com um time mais próximo do que Martinez espreita para a estreia, com Palhinha à frente dos centrais, Vitinha e Bruno Fernandes a serem quem deve fazer a bola chegar à frente, onde o tridente ofensivo era composto por Bernardo Silva, Gonçalo Ramos e João Félix.
Como os Made in Seixal buscam o jogo interior, a ideia era abrir espaço para as descidas de Diogo Dalot e Nuno Mendes. O problema é que estes nunca conseguiram pisar estes lados do campo e a disputa ficou toda no meio, onde justamente a Croácia faz o que quer, como quer e quando quer, e contra quem quer que seja. Basta que existam condições para seus mais graúdos talentos possam desfilar.
A passarela atendeu pelo nome “relvado do Jamor”.
Tudo bem que o pênalti, que de tão estúpido não deveria ter sido marcado, justamente porque Vitinha não o cometeu, condicionou o jogo, mas o fato é que a primeira parte da turma lusitana foi algo que roçou a indigência dos piores momentos vistos daquele período infeliz entre o pós-Copa de 1986 e a afirmação da geração bicampeä mundial júnior, quando, com muita boa vontade, Portugal era daquelas seleções que hoje estariam entre os grupos C e D da Liga das Nações.
Não fosse por Diogo Costa, e aqui está um dos motivos que fazem o mister tirar algumas notas positivas, e o primeiro tempo terminaria com a vaca lusitana já deitada. A segunda parte pedia mudanças para além do planejado para dar minutos à toda a gente – exceto o Rio Patrício, que deve ser um bom contador de anedotas no balneário.
Depois do recreio, o time das Quinas voltou com alterações: os dois laterais, que nem pareciam ter entrado, sairam, rendidos por Semedo e Cancelo; o desastroso, indolente e desatento João Félix também ficou no balneário, fazendo companhia a Gonçalo Ramos, que destes pode ser o único a se considerar uma vítima das circunstâncias ou do sistema que aglutina jogadores com características de posseiros da bola, mas nenhum com rasgos para fazer as funções diferentes que cada quinhão do relvado exige. Diogo Jota e Rafael Leão foram lançados e nos pés deles residiu boa parte da melhora do jogo de Portugal, não pelo sistema apresentado, mas pelas características dos executantes.
Três foram os minutos necessários para que os lusos igualassem as coisas. Semedo fez o que Dalot não conseguiu e mostrou-se uma opção fiável para Martinez, o que talvez não seja necessariamente uma boa noticia. Mas foi ele quem se apresentou para receber passe açucaradinho de Bernardo Silva e deixou Diogo Jota livre para somente encostar a bota na bola, a poucos passos da linha do gol.
E isso deveria fazer com que o sentido do jogo mudasse. Mas essa igualdade durou menos que a do primeiro tempo. Meia dúzia de minutos depois, o recém entrado Pašalić soltou o sapato da entrada da área, na recarga de um cruzamento que João Cancelo achou por bem meter a cabeça numa bola em que o pé, qualquer um, estava mais à mão. Diogo Costa quase acrescentou mais uma defesa daquelas que o Vitor Baía não faria (a maioria delas, pois), mas a bola foi com estrondo à barra e Budimir recolocou os enxadrezados à frente.
O melhor período de Portugal veio a seguir. Insinuante, incisivo, pressionador, empurrando os adversários contra as cordas. Em pouco menos de 10 minutos, criou-se mais que na primeira parte – e naquele período entre a segunda metade de 1986 e 1992. Mas foi sol de pouca dura e a partida voltou a ser simpática aos croatas, que estiveram mais próximos do terceiro do que de sofrerem o empate, que ainda esteve por vir nos remates de Pedro Neto e Rúben Dias.
Para terça-feira, no Aveiro, há a Irlanda do Norte no derradeiro teste antes da Euro. Roberto Martinez, se não houver alguma questão física a apoquentar alguém, deverá levar a campo o onze que imagina para a estreia, contra a Chéquia, no próximo dia 18.
A primeira derrota de Portugal para a Croácia, seja como for, deixa alertas que chegam a tempo: i) de nada serve ter uma riqueza tática se não for escolhida a estratégia mais adequada (como tentar tirar a bola do meio-campo é quando um gajo chamado Modric está com uma camisola diferente daquelas que seus comandados vestem); i) se o Pepe não puder jogar, e Oxalá que jogue, Gonçalo Inácio não é o central mais adequado para fazer companhia a Rúben Dias porque não está habituado a jogar somente com um central ao seu lado e os espaços que deixa entre si e o lateral esquerdo, seja ele quem for, mostram isso, além da dificuldade de fazer a recomposição defensiva nestas condições, ainda mais quando a bola for perdida em zonas mais altas do campo; e iii) agradeçam aos croatas por gritarem que o rei, que venceu 10 em 10 nas eliminatórias, contra ninguém, e sofreu apenas dois golos – e já lá vão oito em quatro jogos após a fase de apuramento, dois em cada -, anda com o rabo de fora.
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As avaliações a seguir têm um certo exagero, galhofa e quase nenhuma base técnica. É favor não levar tão a sério.
Diogo Costa: ser o melhor da equipa indica que as coisas correram bem, mas só para ele;
Diogo Dalot: só não achou que estava no United por causa da cor da camisola (Nelson Semedo: ganha cada vez mais confiança pela seleção nacional, mas essa não é uma boa notícia);
Rúben Dias: ó, Gato, tens 10 dias para mostrar ao Gonçalo Inácio como é que se joga sem ser a três centrais;
Gonçalo Inácio: é sério que o Ruben Amorim nunca te ensinou a jogar numa linha de quatro?
Nuno Mendes: saudade do Clermont, né, meu filho? (João Cancelo: já gostei mais de ti, Joãozinho. Se calhar, mostre ao mister como jogavas antes de ter a brilhante ideia de ser refilão com o Guardiola);
João Palhinha: ó, João, digas ao mister, SFF, que não é porque tu tens oito nomes que deves bastar para marcar toda a gente que estiver a vestir uma camisola diferente da tua. Duvidam que são oito? O gajo se chama João Maria Lobo Alves Palhares Costa Palhinha Gonçalves. Estou a mentir ou o quê?;
Vitinha: não é porque o João Palhinha tem oito nomes que deve bastar para marcar toda a gente que estiver a vestir uma camisola diferente da vossa. Mas jogaste bem a segunda parte (Matheus Nunes: chegaste a tempo de fazer mais que o João Félix. Só ter calçado as botas corretamente já bastava);
Bruno Fernandes: podias imaginar que estás no United e arriscar um pontapé de fora de vez em quando. Pela primeira parte miserável, dava até pra achar que o careca no banco era o Ten Hag (deu lugar a Pedro Neto, que promete fazer barulho na Euro. Só não pode ser quando todos estiverem a dormir. Não, a dormir mesmo, não como na primeira parte);
Bernardo Silva: quando o mister mandar que fiques aberto do lado direito, faças o favor de dizer que o português dele é incompreensível. Não é, sabemos, mas também não dá para entender que raio tu fazes por lá;
Gonçalo Ramos: vamos fazer um acordo? Voltas ao Benfica, pegas ritmo de jogo e aí serás o substituto do Cristiano quando ele se retirar, depois da Copa de 2030 (Diogo Jota: a sério e com ritmo, é o avançado mais completo do plantel. Quem sabe na próxima Euro?);
João Felix: definitivamente, não era jogo para o João Félix. A propósito, faz tempo que os jogos não são para ele (Rafael Leão: era bom aproveitares esses dias em Portugal e ter com o Quaresma para perguntar como ele acertava os passes dentro da área. Tenho certeza que ele lho dirá);
Roberto Martinez: ó, Fernando Santos, és tu?
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