domingo, 12 de abril de 2015

Questão de sobrevivência

No final de semana dos jogos das quartas-de-final do Campeonato Paulista, a Globo resolveu mudar sua grade de programação para acomodar o jogo do Corinthians. Com isso, o futebol passou do domingo, dia tradicional de transmissões ludopédicas na TV Plim-Plim, para o sábado, já que o jogo do dia que abre a semana era o do Santos. A atitude dos executivos da posseira do futebol brasileiro mostra que, haja o que houver, apenas o clube do Itaquerão lhes inspira interesse.

Montagem encontrada na internet
Este blogue, é bom deixar claro, não é contra uma empresa lucrar, tampouco tem uma queda rasa pelo romantismo no futebol. Isto é capitalismo e até a China "comunista" sabe disso. A questão é outra: a TV não é entidade filantrópica, mas é uma concessão pública. Tudo bem que neste prostíbulo que chamamos de Brasil, não quer dizer muita coisa, já que, por lei, as concessões de teledifusão não poderiam ser entregues a políticos ou grupos ligados a eles, e sabemos que não é bem assim que a banda toca. Ainda assim, é uma concessão e deve (ou deveria) seguir regras.

Ora, o futebol é um patrimônio cultural e imaterial do país, e, embora quase ninguém leve isso em consideração, o seu dono é o próprio Brasil. Como acontece com toda concessão, seja de rodovias ou recursos naturais, quem quer ganhar dinheiro com ele tem que dar uma contrapartida. OU alguém acha que a Petrobrás investe em cultura só porque acha bonito?

Qualquer emissora que detém os direitos de transmitir o futebol deveria dar espaço a todos os times na sua grade de programação. Obviamente, quem garante um maior retorno deve ter um espaço maior e não há pecado algum nisso. O que não pode é um clube ter 30 jogos na TV aberta, ou em canais pagos, mas com sinal aberto para seus assinantes, e outros só passarem no pay-per-view. Do jeito que está, aumenta a disparidade entre os times, e quem perde é o próprio esporte.

Senão, vejamos: mais torcedores - maior audiência - mais espaço na TV - melhores contratos de patrocínio - melhores jogadores - títulos - mais torcedores - maior audiência - mais espaço na TV - melhores contratos de patrocínio - melhores jogadores - títulos - mais torcedores... E temos uma bola de neve que esmaga equipes não agraciadas com tais benesses. 

Assim, o fim das atividades de União São João e XV de Jaú não são casos isolados. Claro que a má gestão é responsável por uma parcela significativa para explicar o ocaso destes distintivos, mas não é a única causa. A Alemanha, que acabou de ser campeã aqui, no nosso quintal, passou por um tratamento de choque que revirou completamente o futebol no país. Em todo o país. E em todos os níveis. Com o objetivo de reestruturar o esporte a partir do fortalecimento do campeonato nacional, e, consequentemente, dos clubes, medidas importantes foram tomadas, como, por exemplo, permitir que estes distintivos andem com as próprias pernas, sob o comprometimento de investir nas categorias de base.
Equipe de Araras, que foi o primeiro clube-empresa do país e revelou
Roberto Carlos para o futebol, encerrou suas atividades
Desta forma, todas as equipes passaram a ter, uns mais, outros menos, espaço na mídia e direito a uma cota de TV decente. Times mais atraentes, como Bayern e Dortmund, ganham mais, é óbvio, mas até nanicos como Paderborn e St. Pauli têm jogos na grade de TV, que é vendida para todo o mundo. Transmissões via PPV não contam, pois, para os departamentos de marketing, têm o mesmo efeito de colocar um outdoor dentro da casa do seu torcedor, que já conhece o produto e os seus parceiros. Além do mais, ninguém vai desembolsar um puto para  ver jogo de um time para o qual não torce. E voilà! 7 a 1 não foi acidente!

Pior derrota do Brasil em Copas não foi acidente (Foto: Jefferson Bernardes/VIPCOMM)
Mudar o status quo não vai, definitivamente, fazer Criciúma ou Ponte Preta, ou Portuguesa, serem campeões brasileiros, mas vai viabilizar a existência (sem prostituir sua camisa) de emblemas médios ou pequenos. Não é filantropia; é a sobrevivência do próprio futebol brasileiro.        

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