quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

PORTUGUESA - Sobre respeito, necessidade e pertencimento

Foto: Ronaldo Barreto/NETLUSA

Antes de qualquer coisa, é importante reconhecer que a gestão Castanheira tem um saldo positivo de proporções bíblicas e que, sem exagero algum, ajudou a devolver decência e dignidade à Portuguesa. Dito isto, ninguém está isento de críticas. Nem mesmo quem tanto já acertou – e isso nem precisava ser dito.

Muita tinta tem corrido desde que o clássico com o Corinthians foi levado para Brasília por 1 milhão de dinheiros para pagar as contas. Não há um consenso sobre o tema e muitas das reações dos torcedores foram negativas. Claro que existem os que concordaram, pois "não existe almoço grátis", "é preciso pagar as contas". Sim, sei de tudo isso, mas este jogo, especificamente, não poderia ser disputado longe do Canindé.

A nota oficial assinada pelo presidente Antonio Carlos Castanheira, então, atribuindo a decisão à falta da presença maciça dos que vestem verde e vermelho nos jogos ou a baixa adesão ao Sócio-Torcedor é pouco lisonjeira, sendo simpático, a quem tanto fez e faz pela Lusa.

Além do aspecto técnico, o financeiro é importante – e isso é tão óbvio quanto afirmar que quem fizer mais golos vencerá – mas não pode estar acima do sentimento do torcedor. Fosse uma temporada qualquer, seria somente um jogo em que a possibilidade da casa cheia de torcedores rivais seria um remédio amargo, mas necessário, como em tantas vezes.

Mas, caraças! Foram quase oito anos longe de qualquer vestígio de futebol de elite. E justamente quando há um clássico com o rival de quem dá mais prazer de vencer, levam o raio do jogo para Brasília? Negar esta experiência ao torcedor, aquele que mantém o clube respirando e que não lhe virou as costas no pior momento da centenária história lusa, é de uma infelicidade enorme, para dizer o mínimo.

Na temporada 2013, a Portuguesa vendeu dois mandos de campo no fatídico Brasileirão: contra o Corinthians e contra o Flamengo. Na época, tanto quanto hoje, era preciso vender o almoço para pagar a janta, mas eram tempos em que os clássicos em casa eram normais. Não são raros os torcedores da Portuguesa que nunca viram um jogo contra Corinthians, Palmeiras, São Paulo ou Santos no Canindé. Uma vitória, então, é preciso recuar até a 26ª rodada do Campeonato Brasileiro de 2013 (um baile de 3 a 0 sobre o Santos). Pelo Paulistão, o viratempo tem que rodar mais, muito mais, e transportar o torcedor ao ano de 2001 (1 a 0 sobre o São Paulo).

DOIS MIL E UM! São impensáveis duas décadas. Se por um lado essa informação dá munição para quem acha que a questão técnica não pesa e o Corinthians seria o favorito no Canindé, em Brasília, no Pacaembu ou na Lua (e seria mesmo), por outro, um dos pilares que sustentam o ato de torcer por um time de futebol que não é lá muito habituado a glórias em campo é a sensação de pertencimento. Tire-nos isso e quase nada nos restará.

Voltando quatro parágrafos, a grana é necessária para que não só o funcionamento do clube seja viabilizado, mas sua própria existência. No entanto, como apontou aqui mesmo no NetLusa o Antonio Carlos Zorzi, se essa quantia – que é considerável, mas que não resolverá a vida de ninguém – é imprescindível, em algum momento, o planejamento financeiro para participar da elite foi falho. Quando o clube se converter em SAF, de nada adiantará um eventual aporte se quem determina onde e como será usado, errar.

Como também apontou o Zorzi com a habitual precisão de suas linhas, a Portuguesa só existe ainda porque tem uma torcida apaixonada e que nunca a largou, mesmo com todos os motivos do mundo para isso.

Não é assim que se trata quem te ama.

Texto originalmente publicado no NETLUSA

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