Por Fabio Venturini*
O contrato do camisa 10
palmeirense está acabando. Parte (grande) da torcida não quer a renovação,
embora saiba que Valdívia é um talento diferenciado, com a desvantagem de estar
pouco disponível por conta de lesões que o tiraram de mais da metade das
partidas nos últimos anos.
A diretoria alviverde propõe
um contrato de produtividade: o atleta recebe um “pequeno” valor fixo e, para
ter o mesmo vencimento atual, precisa jogar cinco ou seis partidas por mês. A
imprensa esportiva sentencia que a diretoria palmeirense está certa para
proteger o clube. Valdívia não quer.
A despeito desse senso
comum alienado, não há como interpretar tal proposta de forma diferente como
oportunismo puro. Não se trata de defender o clube, mas de atacar um
trabalhador.
Sim, um trabalhador. Se
Valdívia não se empenha é uma questão moral. Na essência, o jogador é um
assalariado que já tem parte de seus direitos sonegados por conta da figura dos
“direitos de imagem”, um subterfúgio para não pagar impostos e direitos
trabalhistas.
Quando o Palmeiras tenta
vincular a remuneração às entradas em campo exclui do pacote as obrigações de
participar dos treinos, estudar adversários, concentrações, preparação física para
evitar lesões etc. Tudo isso é trabalho que tem como ponto visível os 90
minutos da partida de quarta ou domingo (tratando-se de Palmeiras, não raro
terças e sextas). O clube, não coincidentemente presidido por um banqueiro, classe
que não tem lá muito zelo pelo bem estar do trabalhador, quer se aproveitar de
uma situação para sugar trabalho não remunerado até a última gota.
Paulo Nobre (dir) com Alexandre Mattos. Presidente do Palmeiras instituiu a figura do contrato e produtividade no alviverde (Cesar Grecco/ Divulgação) |
Ah, mas ele machuca muito,
não dá para pagar 500 paus para não jogar.
Então estamos com
seríssimos problemas de ordem moral.
1) Tratar da saúde com
vistas a atuar por um clube de futebol é trabalho. Se Valdívia não gosta de
jogar futebol, presume-se que, em outra profissão, não faria os treinos
específicos para ser meia do Palmeiras. Logo, quem compra sua força de
trabalho, se não quer pagar por toda essa força, apenas por parte dela, está
sendo oportunista, quando não desonesto;
Meia sofre lesão. Acidente de trabalho que deixaria o trabalhador sem rendimentos (AE) |
2) Se as contusões são
fingidas, o trabalhador não é confiável, é desonesto na relação comercial em
que a entrega do trabalho é um cânone na moral burguesa. O mais correto a ser
feito pelo empregador seria abrir mão de um novo contrato. A produtividade,
neste caso hipotético, é, portanto, uma falta de respeito com o dinheiro da
instituição administrada por esta diretoria;
3) Se o jogador machuca
muito porque seu corpo não é capaz de atuar profissionalmente, a diretoria
palmeirense, dentro da moral burguesa que defende diuturnamente na sua
presidência banqueira, está I) sendo pouco zelosa com o dinheiro do clube
contratando alguém que não poderá dar retorno e II) aproveitando-se de uma
fragilidade da saúde de uma pessoa. Se ficar doente, Valdívia não recebe para
se tratar e voltar a atuar. Se quiser o mesmo salário precisará jogar mais do
que seu corpo aguenta e fatalmente se lesionará, ficando fora, sem receber
salários. Se for bem e participar dos jogos da seleção chilena, não recebe, ou
seja, a valorização do seu trabalho é sua ruína financeira. Neste caso, a
diretoria palmeirense é oportunista e desumana.
Valdívia com o Chile na Copa de 2010. "Castigo" pelo bom desempenho (AP) |
A crônica esportiva apoia
como o exemplo mais bem acabado da alienação. Muitos com contratos semelhantes
de personalidade jurídica como se os problemas do mundo fossem culpa do
trabalhador. Sua formação política chega próximo da estupidez ao defender a
arma com a qual é ferida.
Valdívia está certo. Não
deve aceitar este tipo de contrato. E não é algo apenas para o bem dele, mas de
todos os jogadores no Brasil. E não devemos achar que essa proposta é algo
normal.
*Fabio Venturini é jornalista
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