sábado, 25 de julho de 2020

Benfica 2 x 1 Sporting - a honra, o roto e o rasgado

PELO ORGULHO Não fosse um clássico, última rodada de
Sporting e Benfica daria sono (Foto: Patricia Melo Moreira)

O Derbi Eterno colocou no relvado do Estádio da Luz um Sporting à procura de garantir a terceira colocação da Liga - e a entrada direta na fase de grupos da Liga Europa - e um Benfica que já não poderia ser campeão, mas não perderia o segundo posto e a vaga na terceira eliminatória da Liga dos Campeões. Ainda havia o tempero da ironia e da pequena vingança do Braga, que poderia, com uma combinação de resultados, passar à frente justamente do clube que tirou-lhe o treinador. 

Ironia maior ainda o fato de, em caso de empate de pontos, a pesar a favor dos arsenalistas estava o golo marcado fora de casa no confronto direto. O Braga perdeu na primeira volta por 2 a 1 quando era treinado por Sá Pinto, mas venceu em seus domínios por 1 a 0, já orientado por Ruben Amorim, que, afinal, terminaria ultrapassado por si mesmo.

O que poderia não valer nada aos encarnados, afinal, valeria tudo para quem perdeu tudo no segundo turno. O Benfica poderia, apoiado por uma vitória do Braga contra o Porto, que jogava ao mesmo tempo da Pedreira, arrancar os mais históricos rivais do pódio e atrapalhar a próxima época, comprometendo a preparação para 2020/2021 com um jogo decisivo logo no arranque. 

"Minha senhora, a senhora não sabe o que é Benfica e Ishpurtingui", diria a versão portuguesa do espetacular Edil, do filme Boleiros - Era uma vez o futebol, para quem achasse que o jogo não teria serventia alguma. Honra e objetivos em campo, o Dérbi de Lisboa começou à pancada, basicamente o Sporting tentando sair jogando desde os três defensores, como gosta o Ruben Amorim, e o Benfica fechando os caminhos à base da foice, mesmo que isso custasse alguns cartões amarelos na primeira meia hora de jogo.

Até que Nelson Veríssimo percebeu que, adiantando os médios e abrindo Chiquinho de um lado e Tavares do outro e dando a Pizzi liberdade para criar, causaria tantos erros quantos quisesse aos de Alvalade. Assim, chances de gol foram sendo amontoadas - e desperdiçadas - pelos de vermelho, que mandavam no jogo. Perdulário, o Benfica foi para o intervalo somente com 1 a 0, obra do inesperado Seferovic, com seu quinto golo na prova.

Amorim voltou para a segunda parte sem o apagado Gonçalo Plata, rendido por Tiago Tomás, que, combinando com Nuno Mendes, transformou a vida de André Almeida num inferno. Foi do pé de Tomás que saiu, além de uma bola na trave depois de uma falha bisonha de Jardel, o passe para Sporar, que também já deixara avisos pelo caminho, devolver a terceria colocação ao Sporting. Pouco antes, na Pedreira, a Braga já havia virado seu jogo com o campeão Porto.

A essa altura, Florentino (no lugar de Gabriel) e Carlos Vinicius (saiu Seferovic) já estavam em campo, mas foi a entrada de Rafa no lugar de Chiquinho que devolveu a cimeira do jogo aos Encarnados. Era o maior dos dramas de Ruben Amorim, que aprendeu da pior forma possível que somente pode gostar de ter a bola o time que tem qualidade para isso também no banco - não que a tivesse no 11 inicial -, coisa que somente Veríssimo tinha à disposição. E foi o brasileiro que, saltado da suplência, chegou aos 19 tentos, vencendo a concorrência de Taremi e de Pizzi, que ficaram nos 18. Justamente em passe precioso de Pizzi, indiscutivelmente o melhor benfiquista do certame.

Um triste final para todos, do Alvalade à Luz: a quem, duas rodadas antes sequer havia perdido pelas duas equipes que treinou e, com um ponto nas últimas jornadas, falhou o último objetivo de uma época perdida, não por culpa sua, mas do clube que teve quatro treinadores em 2019/2020; e àquele que, com o maior orçamento, as maiores vendas, os maiores gastos, a pretensa ideia do domínio doméstico, pode festejar apenas o fato de poder rir-se ao rival, como numa disputa entre o roto e o rasgado.

Pouco para águias e leões, mas foi o melhor que conseguiram. 

Vlachodimos: se o Ody disse "mas que car***" assim que foi vazado por Sporar, já terá demonstrado ao Jorge Jesus que está perfeitamente à vontade em Portugal, ainda mais tendo jogado boa parte da campanha com Weigl à frente dos zagueiros;

André Almeida: poderia ter dado pancadas nos dois miúdos atrevidos de Alvalade para manter a honra intacta. Seria expulso, mas daria mais gosto aos adeptos vencer com um a menos. Ou em igualdade numérica na prática, considerando o que (não) jogou o Wendel;

Jardel: interessante a tática de chutar o ar, errar a bola e dar a chance ao adversário para empatar e ter mais alguma emoção na partida. Como não deu em gol, resolveu não marcar o Sporar no lance do empate. Contra equipes mais fortes, como o Santa Clara ou o Marítimo, por exemplo, não seria aconselhável;

Ruben Dias: uma cacetada ao Jovane para mostrar quem é que manda, um passe para o golo de Severovic e uma bola na trave. Quem dera o Ruben tivesse um adversário mais forte na sua provável despedida da Luz;

Tomás Tavares: espero que o Jorge Jesus não se convença, a partir da boa partida que fez, que o Tavares de penteado mais original do plantel é uma boa opção para render Grimaldo;

Gabriel: suspeito que tenha saído para o Weigl não achar que é pessoal o negócio (Florentino: espero que conste no contrato do Jorge Jesus a cláusula  pétrea "escale o Florentino. Tire até o guardarredes, se quiseres, mas escale o Tino");

Weigl: e não é que a calça de ganga de 20 milhões começou a vestir bem? Tudo bem que o adversário era mansinho para os padrões do Sporting, mas fez sua melhor partida. Até às cacetadas andou;

Pizzi: um autruísta, capaz de oferecer o golo que o tirou do cume dos artilheiros para, com algum jeito, valorizar o avançado que o marcou. Além do mais, 30 golos na temporada, sendo médio e a jogar no mais bagunçado Benfica desde Quique Flores, é coisa que nem o Messi conseguiria;

Chiquinho: cansou os gajos de verde e branco para Rafa terminar o serviço. (Rafa Silva: pegou os gajos de verde e branco cansados e terminou o que o Chiquinho começou. O Rafael Alexandre já está habituado a fazer isto aos que vestem verde e branco, começando ou terminando as partidas); 

Cervi: em 1907, o Sporting levou do Benfica oito gajos a troco de banho quente e uniformes limpos. Pouco mais de oito décadas depois, levou pela porta pequena Paulo Sousa e Pacheco, e só não foram também João Pinto e Rui Costa porque não quiseram. Deve ser por isso que o Cervi não meteu o golo quando estava desmarcado à frente da baliza, para não diminuir as esperanças de quem as manteve até o minuto 88. Sou rancoroso? Serei até tirar alguém de Alvalade. Pelo que mostraram esta época, porém, seguirei com a mágoa por mais algum tempo (Jota: mais três minutos de Jota e ainda não entendi o porquê, passados quase 200 minutos. Duvido até que o João Filipe saiba);

Seferovic: certa vez, Nelson Rodrigues disse que é preciso ter sorte até para chupar um sorvete. Eu digo que, mais que sorte, é preciso ter confiança e nada como um Sporting pelo caminho para que aconteçam coisas inusuais, como um avançado do Benfica-2020 começar o jogo e anotar um golo (Carlos Vinicius: eu, que andava incomodado com ele, posso dizer, feliz da vida, que causar embaraços aos do José Alvalade já garante ao Carlinhos um lugar especial no meu coração. Nem precisava terminar na artilharia do campeonato);

Nelson Veríssimo: terminou o campeonato com alguma dignidade. Para sábado há mais. Se o mister quer um conselho, lá vai: deixe a bola com o Porto, assim como deu ao Sporting. Eles não sabem lá muito bem o que fazer com ela. Bom, o Benfica também não. Pelo visto, em Portugal, quase ninguém sabe.

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