segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Ucrânia 2 x 1 Portugal - O preço da teimosia

MERECIDO Ucranianos comemoram classificação
(Foto: Valentyn Ogirenko/Reuters)
A teimosia de Fernando Santos custou, enfim, a terceira derrota da Seleção Portuguesa em jogos oficiais desde que o Engenheiro do Penta assumiu o comando da equipe nacional. Portugal, que já havia sido superado pela Suíça por 2 a 0 na primeira partida depois do título da Eurocopa; pelo Uruguai por 2 a 1 nas oitavas de final da Copa do Mundo de 2018; e agora pela Ucrânia, em novo 2 a 1, mas pelas Eliminatórias para o Euro 2020, teve em comum dois fatores: a formação em 4-3-3 e o time ser batido por equipes teoricamente mais fracas, mas mais bem montadas em campo.


O pecado do 4-3-3 português não está simplesmente na formação, mas nas caracterísitcas das peças e em como estas estão distribuídas em campo. Contra uruguaios e ucranianos, Portugal teve mais bola para jogar, mas as ideias do que fazer com ela não vieram junto. Enfrentar os super atacantes Cavani e Suárez até torna aceitável o revés contra os uruguaios - embora a falta de argumentos táticos e técnicos tenha sido preponderante para a eliminação -, mas não havia um jogador ucraniano sequer melhor que seu oponente na partida que definiu a classificação da equipe do mítico Shevchenko por antecipação para a Eurocopa, o que torna a condição portuguesa mais preocupante, nem tanto pelas chances de classificação para a Eurocopa - basta vencer a Lituânia em casa e Luxemburgo fora, caso a Sérvia vença seus dois jogos -, e sim pelo que Portugal vai apresentar em jogos mais complicados.

Com relação ao time que venceu Luxemburgo por 3 a 0 três dias antes, Fernando Santos escalou Gonçalo Guedes e João Mario nos lugares de João Félix e Bruno Fernandes. A escolha de Guedes para render João Félix foi bem justificada: Santos queria que Guedes desse mais largura ao ataque, numa função que João já tentou desempenhar e foi infeliz. Só que a prestação do atacante do Valência foi desastrosa, fruto da outra escolha do treinador ao deixar o leonino no banco sob sabe-se lá qual ideia de jogo.

Ao barrar Bruno Fernandes, Portugal perdeu a capacidade do remate de fora da área contra uma defesa que fechou-se em copas para administrar o gol madrugador que marcou - e que condicionou completamente a partida. O gol não era algo previsível, mas sabia-se que os donos da casa marcariam sob pressão e dariam pouco espaço para o jogo luso no campo de defesa, além de explorar os espaços entre as linhas, onde Portugal sempre foi inferior numericamente e, por consequência, em atitude. Outro ponto importante: a ausência de jogadores capazes de infiltrarem as linhas ucranianas estava clara desde a divulgação do 11 inicial, sobretudo pelo desfalque de William Carvalho. Em seu lugar, Portugal teve a volúpia de Danilo, mas pouca lucidez nos passes para romper os bloqueios defensivos, que poderiam sair dos pés de Rúben Neves, mas este jogou pouco mais que um par de minutos contra Luxemburgo.

Ora, se queria alargar o campo, que colocasse Bruma, única peça à disposição realmente talhada para o trabalho, em vez de lançar Guedes ou Félix para isso. Quando insiste no modelo de jogo engessado que adotou nos primeiros tempos contra Luxemburgo e Ucrânia - e já havia sido assim contra a Lituânia -, Fernando Santos mata a principal qualidade dos homens de frente portugueses, que é a movimentação de Bernardo Silva e seja lá quem for o outro extremo, uma vez que Cristiano Ronaldo tem jogado como referência da equipe. E assim seria em qualquer lugar do mundo, com qualquer treinador do mundo. 

Quando conseguiu arrumar a casa, também por conta da expulsão de Stepanenko no lance do pênalti que originou o gol 700 de Cristiano Ronaldo, Portugal esbarrou em outra grande atuação de Pyatov, na péssima noção de posicionamento de João Félix, quando Bernardo Silva estava pronto para comemorar o gol de empate português, e no azar da bola na trave de Danilo, no último lance do jogo, mas parece-me complicado falar em azar para quem fez tão pouco para merecer melhor sorte.  

sábado, 12 de outubro de 2019

Portugal 3 x 0 Luxemburgo - O toque da concertina

MAIS UM Faltam seis para o centésimo pela Seleção das Cinco Quinas
"A concertina, que não para de tocar,
Deixa uns com o pé no ar 
Outros no chão a bater.
Lá vem mais um chegando pra brincadeira,
Vai dançar a noite inteira
Até o dia amanhecer."

A música O Toque da Concertina fez parte do álbum Refazendo História, que o saudoso Roberto Leal gravou em 1996. Era o início do resgate das raízes da carreira do recém falecido cantor. Assim como ele o fez, a Selecção das Quinas está em busca do resgate de sua identidade, que tem se mostrado tão elástica quanto o fole do tradicional instrumento dos folclores e bailaricos lusitanos. Afinal, quem é Portugal - o time que ganhou a Eurocopa com raça e inteligência? Os que massacraram a Holanda na final da Liga das Nações? A falta absoluta de ideias na Copa da Rússia?

O Toque da Concertina representa bem o que foi o jogo entre Portugal e Luxemburgo, válido pelas Eliminatórias da Euro 2020. Ainda com um jogo a menos que a concorrência no Grupo B e ocupando o segundo lugar, Portugal entrou em campo devendo uma atuação de gala, uma entrada à campeão. Bem, ainda não foi neste jogo no José Alvalade que os comandados de Fernando Santos demonstraram por que reinam na Europa (quem duvidar que veja quem é o atual campeão europeu e da Liga das Nações), mas a concertina, nas mãos de Fernando Santos, começou bem o bailarico no campo do Sporting.

Leia também:
Lituânia 1 x 5 Portugal - Deixa jogar, mister

O corridinho não se dança devagar

Foram 16 minutos intensos, com Cristiano Ronaldo mais adiantado, Bernardo Silva com o diabo no corpo e João Félix, de volta ao time titular, com boa movimentação para completar o trio muito bem servido por Bruno Fernandes e João Moutinho - este no lugar do lesionado William Carvalho. Se o primeiro gol quase saiu na jogada de Joões, quando Moutinho deu o gol para Félix, que dominou com perfeição, mas bateu rente ao poste, o quase ficou para trás na ótima enfiada de Fernandes para Nelson Semedo, que ganhou da marcação e dividiu com o goleiro Moris. Na sobra, Bernardo Silva dominou e, com imensa categoria e calma, abriu o marcador.

O jogo, assim, prometia. 

Um dança o vira, outro dança o malhão

Prometia, mas não cumpriu. E não cumpriu porque nem todos dançavam a mesma dança. Até o fim da primeira parte, o único lance de perigo foi de Luxemburgo, quando Thill tirou Rúben Dias para dançar, mas parou na defesa de Rui Patrício (que o juiz não viu, anotando tiro de meta). Fernando Santos ainda tentou abrir o fole da concertina para o som fazer a malta lusitana dançar, mas somente Bruno Fernandes e Cristiano Ronaldo foram para a roda.

Um bate forte, o outro não sabe bater

Que João Félix é um dos talentos mais prometedores dos últimos tempos, não resta dúvida, mas ainda precisa maturar um bocadinho para fazer jus à titularidade, mesmo estando melhor a cada jogo. Na etapa inicial, ele teve a baliza à disposição, mas errou. Cristiano, na segunda, deu bicicleta, driblou e chutou no canto, fez o diabo. E o gol, ou melhor, golaço, saiu de uma troca de passes desastrosa da defesa luxemburguesa (é assim que se diz?). O camisa 7 apertou Chanot, roubou-lhe a bola e com requintes de crueldade encobriu Moris. 699 gols na carreira, 94 na Seleção e os três pontos na algibeira. A esta altura, se viu que o intervalo havia feito bem  aos campeões e todos voltaram no ritmo do corridinho que iniciou a apresentação

Lá vem mais um chegando pra brincadeira

Mas ainda houve tempo para Gonçalo Guedes, que foi titular contra a Letônia, fazer o dele quando o desinteresse já tomava conta da malta, que já estava com a cabeça no repertório para a apresentação contra a Ucrânia, na próxima segunda-feira (14). Se a turma de Fernando Santos vencer e a Sérvia não ganhar da lanterna Lituânia, já podem arrumar a tocata para a Euro. 

Fernando Santos tem pelo menos 18 jogadores em condições para montar uma equipe competitiva, mas ainda precisa decidir se anda com o fole da concertina aberto, a fazer mais barulho, ou se o retrai, como fez no indesculpável primeiro tempo contra a Lituânia. A mim, folclorista que sou, apetece mais deixar os gajos que dançam à frente soltos. Que a concertina não pare de tocar. 

Em campo, um por um:
Rui Patrício:
o juiz não percebeu a única defesa que fez. Uma cesta de castanhas teria mais serventia;
Nelson Semedo: sem ter a quem marcar, poderia apoiar mais, mas teve uma boa prestação;
Rúben Dias: não fosse a entortada que levou de Vincent Thill, ninguém o notaria;
Pepe: como não foi driblado, não foi notado;
Raphaël Guerreiro: ouvi dizer que jogou;
Danilo Pereira: um bocadinho de trabalho no meio, mas nada que o fizesse suar mais que Rúben Neves, que jogou por três minutos;
João Moutinho: um luxo a ser desperdiçado na reserva a outras alturas e na França, por anos (entrou Rúben Neves, talvez para dar algum aviso a alguém. Honestamente, não vi se foi o caso);
Bruno Fernandes: jogo sim, jogo não, vai bem na Selecção;
Bernardo Silva: quando vai bem, o mundo está bem (deu lugar a Gonçalo Guedes, que marcou um golito para poder enganar o mister por mais tempo); 
Cristiano Ronaldo: faltou pouco para marcar o 700 no mesmo lugar em que fez o primeiro. Seria bonito. Não tanto quanto o golo que anotou, mas seria. Poderia ser substituído para ganhar sozinho os aplausos, já que tanto gosta e tanto mais os merece;
João Félix: calma lá, ó, miúdo, que marcas o golo pela Selecção. Outra grande exibição de quem poderia esperar um poucochinho mais para sair do Benfica (saiu para retornar o João Mário: disseram-me que foi. Eu não vi).
Fernando Santos: me parece que encontrou a forma para os quatro da frente renderem mais. Cinco, a contar com João Moutinho, mas este não deve  ser titular com frequência.  

Dedico este texto a António Joaquim Fernandes, o Roberto Leal, ídolo e amigo que se foi a 15 de setembro. E que, certamente, estaria satisfeito com a vitória portuguesa.

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Guia prático para detecção de fake news



Um dos fenômenos da comunicação mundial que certamente será objeto de muitas teses, estudos e dores de cabeça na comunidade acadêmica por anos a fio é a propagação das fake news. Elas espalham feito fogo em palha seca simplesmente porque existe um público ávido por ouvir o que quer o que Aristóteles chamou de pathos em seus estudos sobre Retórica. Então, em muitas das vezes, basta a mensagem conter algo que determinado público almeja e voilà! Temos uma fake news prontinha para fazer seus estragos por aí.

Na manhã deste 03 de outubro, meu celular foi bombardeado por perguntas sobre um suposto pedido de falência da Portuguesa de Desportos graças à propagação de uma imagem bem chinfrim, que continha o distintivo luso, os principais títulos de futebol conquistados pelo clube e uma mensagem do tipo "Lusa decreta falência. Sentiremos sua falta". Obviamente, como pregava o jornalista Geneton Morais Neto(1956–2016), meu desconfiômetro jornalístico soou na hora. Quem decretou? Por quê? Onde? Por que não havia saído em veículo nenhum?

A resposta é fácil: é porque era mentira, oras! Fake news, como se convencionou falar de meses para cá. Felizmente, existem macetes para descobrir se a notícia é real ou tão falsa quanto a Grávida de Taubaté. E trago aqui um "Guia Prático Para a Detecção de Fake News".

Boa leitura (e use sem moderação)!

1) É bom demais para ser verdade? É tipo o Messi dizer que quer jogar no seu time ou algo que você gostaria muito que acontecesse?

Pegue o título e jogue no Google. Ou então digite algo como "Messi diz que quer jogar no Flamengo", se a notícia der o Rubro-Negro como desejo de consumo do jogador. se for verdade, todos os veículos repercutirão.

2) Verifique o texto. Tem erros de Português ou de pontuação? Tem como fonte alguém que pode ser qualquer um?

É natural a fonte ser protegida pelo jornalista, mas nem sempre o sigilo é real, ainda mais se tratar de alguém de forma genérica ou especialistas fictícios. Uma busca no Google pode resolver.

3) O texto responde as informações do lead (quem, o quê, quando, como, onde e por quê?

Quando não há data, o rumor pode ir e voltar diversas vezes como se fosse algo recente. A falta das outras informações básicas, como local ou ocasião, traz uma gigantesca chance e ser falsa a informação. Mesmo assim, algumas dessas informações podem ser falsas. Um evento que, na verdade nunca ocorreu, pode ser citado. Uma pesquisa rápida é eficaz para isso.

4) Vídeos e fotos rodam mais que notícia ruim no Whatsapp e nas outras redes de relacionamento. O vídeo é realmente da época em que é dito que ocorreu? A foto não foi manipulada? Tem foto do Flavio Bolsonaro com camisa ofendendo nordestinos rodando por ai até hoje e é falsa, como tem da Manuela d'Ávila atacando o Cristianismo. E que também, obviamente, é falsa.

Faça buscas em imagens. Certamente, a foto original será encontrada sem muito trabalho. O mesmo acontece no caso dos vídeos.

5) É um meme com uma frase desastrosa ou "lacradora"?

Se a frase foi dita mesmo, registros sérios e confiáveis podem ser encontrados. Não achou? Nem leve a sério. Clarice Lispector e Machado de Assis não falaram muitas das frases atribuídas a eles. Eu mesmo posso fazer um desses sobre qualquer pessoa e a qualquer momento.

6) Titulos bombásticos existem para atrair likes. Cuidado para ver se é real, se o conteúdo condiz com o teor da chamada. Muita gente lê só o título (e é por isso que esse tipo de mentira funciona).

7) Tem até link que leva à matéria! Olha só (mas olha só com muito cuidado)!

Tem mesmo? Compare a URL do link que recebeu com a URL do site usado para dar veracidade. Existem casos de cópias de diagramação das páginas inteiras, para confundir o incauto internauta. Tá diferente? Cai fora!

8) Veículos tradicionais não têm a notícia.

Não se enganem. Por mais que o Trump diga que a imprensa é inimiga do país (nem só ele, né?), fatos relevantes saem SIM nos grandes veículos, sejam eles de que viés forem. O que muda é o enfoque, mas o fato não é ignorado.

9) Como são os outros conteúdos do veículo?

É preciso estar atento ao tipo de conteúdo que o veículo publica. É um mentiroso contumaz? Desconfie. É satírico? Ria e compartilhe, caso queira, deixando claro que se trata de uma gozação, ou então não compartilhe para não ficar feio.

10) O mais fácil (e por isso deixei por último): pesquisar nos sites especializados em checagem de notícias, como o E-Farsas, o Boatos.org, o Fato ou Fake e o Aos Fatos. Ou o Lupa, meu favorito. 

No fim das contas, se a notícia despertar o mínimo de desconfiança, não publique, não compartilhe, não divulgue.