segunda-feira, 4 de julho de 2016

Decime que se siente

Umas das acusações mais recorrentes feitas ao genial Lionel Messi é que ele não sente a camisa da Argentina. Que é mais espanhol do que argentino, se é que ainda lhe restaria algo da terra de Perón no caráter. Que é um pecho frio (peito frio). Não cantar o hino do país antes das partidas também depõe, segundo seus detratores, contra si.

Vale, aqui, contextualizar:

Jogando nas categorias inferiores do Newells Old Boys, Messi foi detectado com uma disfunção hormonal que limitava seu crescimento. Como nem o Newells ou outro emblema argentino quis custear o tratamento de 900 dólares por mês, seu pai o levou à Espanha, onde fez testes no Barcelona e foi aprovado imediatamente pelo clube blaugrana, que não só pagou seu tratamento, como empregou seu pai. 

Se quisesse, La Puga poderia optar pela seleção espanhola, mas nunca escondeu de ninguém sua preferência pelo seu país natal, tampouco ter Los Leprosos como time de coração.

Mas por que o cobram tanto?

Messi é acusado de não render pela Albiceleste o mesmo que joga na Catalunha, como se os jogadores que o acompanham fossem os mesmos. Sua personalidade introspectiva reforça a impressão de indiferença, o que faz com que, a cada partida ruim ou desaire pela seleção, os críticos cantem o mesmo tango de sempre. 


Messi chegou a um patamar que não precisaria provar mais nada a quem quer que seja. O problema é que ele é o expoente técnico de uma geração talentosa, mas que não ganhou nada, exceto duas medalhas de ouro olímpicas.

Ao perder sua quarta decisão com a camisa da Argentina (a terceira em três anos seguidos), o genial camisa 10 resolveu abdicar da Seleção, admitindo que fracassou na missão de dar ao país historicamente acostumado a vencer um título que não vem há 23 anos.
Estar à frente do fracasso, após arrebentar em todos os jogos que participou no torneio, o colocou na berlinda outra vez, como quem sucumbe à pressão de ser tão grande usando azul e branco quanto foi Maradona, sua sombra mais escura, mais densa. Justamente este ano, faz 30 que El Pibe de Oro conduziu, praticamente sozinho, uma equipe limitada ao título mundial. E a tão inevitável quanto injusta comparação pesa, embora pese mais ainda quando o Messi argentino é medido pelo Messi barcelonista.  

Pela primeira vez, Messi foi responsável direto pelo infortúnio ao isolar sua cobrança em Nova Jersey. Do contrário das outras ocasiões, desta vez Messi desabou. O desespero ao chutar para fora, cobrindo o rosto com a camisa, como se tentasse buscar refúgio, e que era potencializado a cada gol chileno. O choro antes da premiação. A culpa. Tudo isso desnudou um Lionel Messi que a Argentina desconhecia, um craque com coração e alma. E caráter.

O sofrimento tipicamente portenho o retirou do pedestal, devolveu-lhe a cidadania e o redimiu do pecado de não se sentir argentino. 

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