sábado, 2 de abril de 2022

COPA DO MUNDO - Ela vem aí!

Capitães campeões, Cafu e Matthäus participaram
 do sorteio (Shaun Botterill/Getty Images)

Sim, podemos dizer que a Copa do Mundo de 2022 já começou. Passadas as infindáveis Eliminatórias, quando o sorteio dos grupos é realizado e temos projeções e mais projeções de adversários que podem cruzar o nosso caminho - ou serem evitados a todo custo -, é que a maior competição futebolística do mundo torna-se algo palpável.

Antes de esmiuçar a sorte ou do azar que determinou os duelos e possibilidades até a final do dia 18 de dezembro, é preciso falar que a "escolha" do Catar como país-sede, com farta documentação contendo fortes indícios de corrupção, foi um troço inaceitável, além, é claro, das absurdas vistas grossas feitas pela própria FIFA para as condições - ou falta delas - de trabalho dos operários (ler o trecho da seleção catariana, no Grupo A). Como não recordar da fala emblemática do então secretário-geral Jérôme Valcke, quando ele ficou chiando sobre as dificuldades encontradas naquele Brasil pré-Copa para abrir a porteira e passar a boiada? Para ele, quanto menos democracia houvesse, mais fácil seria para organizar a competição (ou enfiar goela abaixo ou rabo adentro os gastos, para não dizer outra coisa, que este tipo de evento exige). 

Outra prova inconteste do padrão moral extremamente questionável da entidade foi suspender a Rússia pelo ataque militar à Ucrânia, mas fazer de conta que nunca viu coisas como a ditadura da Argentina, onde foi realizado, a toque de caixa, o Mundial de 1978 ou a Guerra do Golfo, liderada pelos Estados Unidos em 1990 e a posterior invasão ianque ao Iraque atrás de armas químicas que sequer existiam, em 2003. "Ah, mas era outro momento e outros dirigentes", o leitor poderá argumentar. Saiba que a Arábia Saudita tem atacado o Iêmen e ó, a FIFA nem se manifestou. Para ser justo, há três anos, a entidade máxima-mas-que-faz-o-mínimo deu um pito no país porque uma emissora local andou pirateando o sinal da Copa de 2018. Isso sim importa.

O ideal seria o local ter sido mudado. Como não foi e vai haver Copa de qualquer forma, vamos a isto. E, com a distribuição dos países, já dá para ter uma ideia do que virá. A grande novidade é que será disputada pela primeira vez entre novembro e dezembro para fugir do calor desumano do verão do Oriente Médio, ou seja, bem no meio do calendário europeu, onde milita a maioria dos jogadores que serão convocados. Por isso, como a entidade ainda não conseguiu alterar o Calendário Gregoriano para, sei lá, 13 meses, os clubes deverão liberar seus atletas para que se apresentem apenas a uma semana do início da prova. É uma vantagem para quem estrear mais tarde, como Brasil e Portugal.

Mas falando no sorteio, que afinal é o motivo deste raio de texto, ele reservou jogos bem interessantes para além dos recordes que volta e meia podem ser quebrados, como o número de jogos (caso Messi jogue todas as partidas e a Argentina chegue ao menos às semifinais) ou os gols marcados, posição liderada por Klose e que tem a ameaça, bastante remota, do compatriota Müller (10) e do quinteto Cristiano Ronaldo, Luis Suárez (7), Kane, Messi e Neymar (6), cujos postulantes precisariam fazer um mundial irretocável para isso.

Por falar em Messi, CR7 e Neymar, esta pode ser a última edição com o trio em campo. O desempenho ruim dos três em seus clubes - também pela zona que são United e PSG - pode fazer com que esta seja a única chance de salvar a temporada. Cristiano, com 37 anos, terá 41 na Copa de 2026. Messi, com 34, já estará ao pé da reforma e Neymar (30), embora não leve muito a sério, já ponderou que esta pode ser a sua terceira e última participação. 

Nos confrontos, reencontros históricos e com pitadas de geopolítica para ninguém colocar defeito, além dos sempre esperados duelos no mata-mata. A se lamentar, obviamente, a ausência da tetracampeã Itália e o cruzamento idiota que colocou Salah e Mané a brigar pela mesma vaga, e que só não fez o mesmo com Portugal e Itália porque a Azzurra conseguiu perder para a Macedônia do Norte.

Bom, feito este introito gigantesco, eis abaixo uma projeção grupo a grupo, seleção a seleção. Se alguém quiser dormir no meu barulho, é só me avisar que eu mando o pix para pegar minha parte do bolão.

Senhoras e senhores, divirtam-se! Alea jacta est

Grupo A
Catar (51º)
Países Baixos (10º)
Senegal (20º)
Equador (46º)

Catar é o atual campeão asiático e tem todos os seus jogadores atuando no futebol local, e só está aí, repito, porque a FIFA é uma instituição com, digamos, padrões morais bastante elásticos. Além do propinoduto que inundou os bolsos de dirigentes suscetíveis a "agrados" (leiam os livros do saudoso jornalista escocês Andrew Jennings), a Copa custou a vida de ao menos 6,5 mil trabalhadores, isso sem contar as diversas violações aos Direitos Humanos, essa "bobagem" que a entidade máxima do futebol só leva em consideração no discurso. Apesar de ter adquirido experiência com a bem sucedida campanha na Copa das Nações da Ásia, do papel até digno na Copa América de 2019 e dos amistosos contra os times do Grupo A das Eliminatórias da Europa, deve levar três cacetes. Quem não torce por isso nem gente é.

A sorte sorriu para os Países Baixos - de volta à Copa após ter falhado a ida à Rússia - quando saltaram do pote 2 para o grupo do Catar, cabeça-de-chave que comprou a vaga na Copa ao comprar o direito de sediar a própria Copa. Novamente treinados pelo lendário Louis Van Gaal, que comandou a campanha do 3º lugar na Copa de 2014, os neerlandeses recuperaram a confiança e têm um time competitivo, embora ainda distante das principais forças da competição.

Atual campeão da CAN, o Senegal tem tudo para ser a sensação do torneio e - por que não? - repetir ou até superar a campanha de 2002, quando parou nas quartas-de-final e faltou um tiquinho só para pegar o Brasil na semifinal. Aliou Cissé, que esteve em campo naquela copa, tem um time bem interessante à disposição, com nomes entre os melhores do mundo em suas posições, como o goleiro Mendy, o zagueiro Koulibaly e o atacante Mané. 

O Equador, que teve uma classificação relativamente tranquila pensando na pontuação, apesar dos percalços no caminho, conta com o zagueiro Piero Hincapié, do Bayer Leverkusen, listado pelo CIES Football Observatory como um dos 10 melhores jogadores Sub-21 a atuar na Europa. Outro nome interessante é Pervis Estupiñán, de excelente temporada no Villarreal. Ademais, o técnico argentino Gustavo Alfaro não dispõe de nenhuma grande estrela ou algumas aspirações além de sonhar com o milagre da classificação. Por estrear contra o Catar, deve manter acesa esta chama até a última rodada, quando dará adeus à Copa com três pontos, justamente os da estreia.

Palpite do editor: este grupo deve ser decidido já na primeira rodada, no jogo entre Senegal e Holanda. Quem ficar em primeiro deve ter a vida mansa nas oitavas. Já o segundo tem 95,894% de chances de pegar a Inglaterra. Aposto em Senegal na ponta e a Holanda que se vire para passar dos ingleses.

21/11 (segunda-feira)
Catar x Equador - 13h
Senegal x Holanda - 7h
25/11 (sexta-feira)
Catar x Senegal - 10h
Holanda x Equador - 13h
29/11 (terça-feira)
Holanda x Catar - 12h
Equador x Senegal - 12h

Grupo B
Inglaterra (5º)
Estados Unidos (15º)
Irã (21º)
País de Gales (18º), Escócia (39º) ou Ucrânia (27º)

Aqui tem História e Geopolítica até os ossos! A Inglaterra, que está na companhia de seus "filhos", os Estados Unidos, na chave, tem um timaço e ele é para agora, depois de maturado pelas semifinais da Copa da Rússia e o inédito vice na Eurocopa. É desnecessário falar que quase todos os possíveis convocados jogam no Inglesão - a exceção é o meia Bellingham, do Dortmund - e é, de longe, a equipe mais forte da chave e uma das mais cotadas para ganhar a Copa. Resumindo, finalmente há a tal geração-mais-forte-desde-1966 e dá toda a pinta de estar prontinha para fazer os súditos da rainha deixarem de ser piada. De quebra, com seis jogos até a estreia no Mundial, é muito provável que Harry Kane chegue à Copa como o maior artilheiro do English Team (tem 49 e divide o segundo posto com o Sir Bobby Charlton, atrás somente de Rooney, que tem 53).

Os Estados Unidos, que venceram a última Copa Ouro, voltam ao Mundial depois de falharem a Rússia, estão com um time bastante renovado e têm nomes bem interessantes, como Pulisic, Mc Keanny e Timothy Weah, filho do lendário George Weah, mas caíram num grupo em que o noviciado deve cobrar o preço, ainda mais quando a principal força tem contas para acertar desde 1950, de um jogo que virou até filme, sem contar o sempre potencialmente quente duelo com o Irã, reeditando o histórico confronto da Copa de 1998, quando os iranianos venceram por 2 a 1. 

O Irã chega à sua terceira Copa seguida com uma dupla de ataque das mais interessantes, formada pelo competentíssimo e cavador de pênaltis Taremi, do Porto, e por Azmoun, que fez carreira no futebol russo, com grande destaque no Zenit e que agora veste a camisa do Bayer Leverkusen. Outro nome sonante é o goleiro Beiranvant, que defendeu um pênalti cobrado por Cristiano Ronaldo no empate por 1 a 1, que quase eliminou os portugueses na primeira fase da Copa da Rússia. E essa fama de estraga-prazeres não é recente. Em 1978, na sua primeira participação em mundiais, empatou com a Escócia, do craque Kenny Dalglish, e este resultado foi crucial para ditar a eliminação britânica no saldo de gols para a Holanda, que seria (bi) vice no vergonhoso Mundial da Argentina. 

Curiosamente, a segunda força do grupo deve vir do confronto da repescagem europeia que não foi definido por causa da Guerra da Ucrânia. A própria Ucrânia tem pela frente a Escócia, que terá a chance de dar o troco no Irã por causa de 1978, mas, para isso, além de vencer os ucranianos fora de casa, ainda têm que despachar o País de Gales, favorito para esta vaga e também para se candidatar a levar uma tunda do segundo do Grupo A nas oitavas. Ah, sem contar que, caso a Escócia chegue ao Mundial, será a primeira vez que o clássico mais antigo do mundo entre seleções (Inglaterra x Escócia) será disputado em uma copa, e justamente na véspera do aniversário de 150 anos do primeiro duelo entre "os pais do futebol moderno".

Palpite do editor: moleza para a Inglaterra avançar em primeiro, com 100% de aproveitamento. O segundo deve ser quem vem da repescagem, com alguma chance para os Estados Unidos aprontarem caso a inexperiência não atrapalhe.

21/11 (segunda-feira)
Inglaterra x Irã -10h
Estados Unidos x Repescagem europeia - 16h
25/11 (sexta-feira)
Inglaterra x Estados Unidos - 16h
Repescagem europeia x Irã - 7h
29/11 (terça-feira)
Repescagem europeia x Inglaterra - 16h
Irã x Estados Unidos - 16h

Grupo C
Argentina (4º)
México (8º)
Polônia (26º)
Arábia Saudita (49º)

O Grupo C poderia ser o T, de teta, para a Argentina, que chega à Copa finalmente com os excelentes nomes que têm agrupados como um time, o que não acontecia desde que o treinador era o saudoso Alejandro Sabella, na Copa de 2014. Será a primeira edição sem a presença material de Diego Maradona, mas alguém tem dúvida de que um eventual título será um milagre atribuído a São Diego? Time para isso, tem de sobra. "La Scaloneta" terminou as Eliminatórias com boas notícias, como a dupla De Paul e Paredes dando o equilíbrio que há tempos não era visto a vestir albiceleste, além de Di Maria envelhecendo como um bom vinho cultivado na França. Além do mais, esta pode ser a quinta e última Copa de Lionel Messi, que voltou a encontrar pela seleção a alegria que nunca teve no PSG.  

O México, que só chegou à fase de quartas-de-final quando sediou a Copa, em 70 e 86 (em 70 as quartas já eram a segunda fase), vem de sete eliminações seguidas nas oitavas, mas tem apresentado um futebol que o credencia a quebrar essa escrita e cair já na fase de grupos, o que nunca aconteceu desde que La Tri voltou da suspensão de dois anos que a tirou do Mundial de 90 graças ao escândalo dos "Chachirules". O único ponto que pode pesar a favor dos mexicanos é que boa parte dos convocados atua na Liga MX e costuma estar à disposição mais cedo que as demais seleções para iniciar a preparação, e isso pode fazer uma diferença danada em favor dos comandados do argentino Tata Martino numa competição que começa sete dias depois da data estipulada para os jogadores se apresentarem. Como curiosidade, se Guardado e Ochoa forem convocados, chegarão, a exemplo de Messi, a cinco Mundiais e igualarão a marca que tem mais dois mexicanos na lista: Carbajal e Rafa Marques, além do alemão Matthäus e do italiano Buffon (Cristiano Ronaldo também deve integrar este lote). 

Teoricamente, a briga pelo segundo lugar do grupo conta também com a Polônia, uma espécie de Amigos do Lewandowski FC. No entanto, alguns são amigos muito estimados, como o goleiro Szczęsny, o zagueiro Bednarek, o meia Krychowiak e o atacante Zielinski, que, se não são craques do primeiro escalão - e não são -, podem auxiliar o supercentroavente do Bayern a passar de fase e ver o que acontece contra, tudo leva a crer, França ou Dinamarca.

Bem, resta aqui a Arábia Saudita, quarta força da chave porque só existem quatro seleções em cada uma. Para não dizer que não há um deserto de ideias, o melhor jogador saudita, Salem Aldawsari, marcou o gol da vitória contra o Egito de Salah na Copa de 2018 e foi o grande nome da campanha das eliminatórias asiáticas. Com um pouco de sorte, somará um ponto, se muito.

Palpite do editor: a Argentina terá vida mansa ao menos na primeira fase. Depois disso, vem o segundo da chave D, que tem França e Dinamarca. A segunda vaga será disputada entre polacos e mexicanos e deve ficar na Europa. Para os sauditas, a vantagem é que o Catar é bem pertinho.

22/11 (terça-feira)
Argentina x Arábia Saudita - 7h
México x Polônia - 13h
26/11 (sábado)
Argentina x México - 16h
Polônia x Arábia Saudita - 10h
30/11 (quarta-feira)
Polônia x Argentina - 16h
Arábia Saudita x México - 16h

Grupo D
França (3º)
Dinamarca (11º)
Tunísia (35º)
Peru (22°), Austrália (42º) ou Emirados Árabes Unidos (68º)

A França é a melhor seleção do mundo no papel? É. Tem pelo menos dois jogadores de alto nível por posição? Em algumas, até três. É uma das favoritas para conquistar o torneio? Não seria loucura imaginar um novo bicampeão em edições seguidas, algo que só a Itália de Mussolini (1934 e 38) e o Brasil (1958-62) conseguiram. É a favorita do Grupo? É, mas terá que ralar para confirmar o status. Apesar de tudo o que tem, e tem muito, a França costuma oscilar bastante na fase de grupos e, nesta edição, tem uma companhia traiçoeira na chave e isso pode fazer com que Mbappé, Benzema e cia reeditem as oitavas de final da última Copa, quando passaram por cima do arremedo de time que atendia pelo nome de Argentina.

Antes da Euro, ninguém dava a mínima para a Dinamarca. Ok, era um time bom, de futebol vistoso, mas que, exceto por 1992, nunca deu em nada. Aí veio o drama do craque do time, o meia Eriksen na estreia da Euro e a recuperação dentro da competição até cair na semifinal para a dupla apito-Inglaterra. Nas Eliminatórias, caiu em um grupo bem baba e passou o carro em todo mundo. Isso sem seu maior expoente, que já voltou e, em dois amistosos, deu mostras que tem tudo para retomar o ritmo anterior e, ladeado a jogadores como Schmeichel, Christensen, Vestergaard, Maehle, e Höjbjerg, incomodar a poderosa França na disputa pela cimeira da chave.  

O grande feito recente da Seleção da Tunísia foi, na CAN, eliminar a Nigéria apesar dos 10 desfalques causados por um teste "duvidoso" de Covid-19, pelas oitavas-de-final. Aí, depois de despachar o favoritismo das Super Águias, o bico das Águias dos Carpatos não foi bom o suficiente para vencer Burkina Faso, caindo nas quartas. Seus principais jogadores, o zagueiro Bronn e o volante Skhiri (Metz-FRA e Colônia-ALE, respectivamente), dão alguma experiência de grandes ligas ao time, mas deve ser insuficiente para mais do que fazer figuração.

E este deve ser o mesmo destino de quem sobrar na repescagem que terá sido deputada pelo Peru, quinto colocado da América do Sul, e o vencedor do duelo entre Austrália e Emirados Árabes Unidos, terceiros colocados de seus grupos nas Eliminatórias Asiáticas.

Palpites do editor: apesar de oscilar, a França, se pudesse, montaria outro time entre os não convocados e, ainda assim, poderia se disputar a Copa sem fazer feio. Deve terminar em primeiro e deixar a Dinamarca no caminho da Argentina.

22/11 (terça-feira)
França x Repescagem Ásia/América do Sul - 16h
Dinamarca x Tunísia - 10h
26/11 (sábado)
França x Dinamarca - 13h
Tunísia x Repescagem Ásia/América do Sul - 7h
30/11 (quarta-feira)
Tunísia x França - 12h
Repescagem Ásia/América do Sul x Dinamarca - 12h

Grupo E
Espanha (7º)
Alemanha (12º)
Japão (23º)
Costa Rica (31º) ou Nova Zelândia (101)º

Desde a Era do domínio da Espanha, entre 2008 e 2012, esperamos que a próxima geração do futebol do país faça o que a turma de Xavi e Iniesta fez. Mas é impossível jogar o que Xavi e Iniesta jogaram se ninguém for Xavi ou Iniesta. E também porque a base daquela seleção, dividida entre Real Madrid e Barcelona, não é a mesma. Em todo caso, com Luiz Henrique, La Roja (ai, não pode mais chamar de Fúria) tem possivelmente a seleção com o jogo coletivo mais maduro, o que, de antemão, deixa os ibéricos com meio caminho andado. Porém, a consistência tática e o domínio de jogo não se traduzem em gols como antanho porque não se trata de um ataque demolidor, no qual Morata, Oyarzabal e Gerard Moreno não convenceriam as próprias mães de que são apostas seguras. 

Após sucessivos papelões, que podem ser entendidos como praga de brasileiro por causa do 7 a 1, a Alemanha disputará sua primeira competição sob o comando de Hansi Flick, que foi auxiliar de Joachin Löw. Sob nova direção, o Mannschaft tem jogado um futebol leve e envolvente que nem na hecatombe do Mineirão foi visto. Uma das primeiras medidas foi reintegrar o atacante Thomas Müller ao grupo. O camisa 13, a propósito, é o maior artilheiro em Copas do Mundo em atividade e, se fizer seis, igualará o também alemão Klose no topo desta lista. No mais, é um timaço com Neuer, o antivax Kimmich - que é um imbecil, mas é um imbecil que joga boa demais -, os atacantes de beirada de campo Gnabri e Sané. Ok, nem tudo é perfeito e há Timo Werner testar a paciência e a resiliência do povo germânico.

Bom, sobra o Japão, que tem suas esperanças depositadas no quinteto Endo, Minamoto, Kubo, Kamada e Morita, e quem vier da repescagem entre a Nova Zelândia - do centroavante Chris Wood, do Newcastle, que atua na Inglaterra desde os 17 anos, do capitão Winston Reid, que também tem muita experiência na PL, e de Liberato Cacace, jovem lateral em bom plano no Empoli - e a envelhecida Costa Rica, que capturou essa vaga pelo rabo. Los Ticos ainda contam com os intermináveis Navas (que é melhor que o Donnarumma), Celso Borges e Bryan Ruiz. Convenhamos, quem tem o Bryan Ruiz não deve estar muita coisa de interessante para fazer acontecer. 

Palpite do editor: na cultura japonesa, o número quatro deve ser evitado por causa da carga negativa que sua pronúncia tem (shi), que é semelhante à palavra morte. Imagino que, depois do sorteio, essa fama deverá ser do dia 1º de Abril. Aqui, o vencedor de Alemanha vs. Espanha (minha aposta aqui) deverá ter uma vida longa e próspera na Copa (ao menos até chegar às quartas de final).

23/11 (quarta-feira)
Espanha x Costa Rica ou Nova Zelândia - 13h
Alemanha x Japão - 10h
27/11 (domingo)
Espanha x Alemanha - 16h
Japão x Costa Rica ou Nova Zelândia - 7h
01/12 (quinta-feira)
Japão x Espanha - 16h
Costa Rica ou Nova Zelândia x Alemanha - 16h

Grupo F
Bélgica (2º)
Croácia (16º)
Marrocos (23º)
Canadá (38º)

Evidentemente, a Bélgica é a grande força deste grupo e esta pode ser o último Mundial em grande nível de boa parte do que vem sido chamado, primeiro como constatação, para depois tornar-se galhofa, de "A Ótima Geração Belga".  Na próxima Copa, jogadores como Courtois, Hazard, De Bruyne e Lukaku estarão com mais de 30 anos. Ainda assim, os belgas chegam à terceira Copa do Mundo seguida com o carimbo de favorito na testa, referendado por quem eliminou Brasil e Portugal nas últimas grandes competições, tendo caído para os campeões em ambas. Mesmo assim, caiu na chave mais "imprognosticável" desta Copa.

A vice-campeã Croácia não tem tido sucesso depois do surpreendente vice-campeonato em 2018. Nesta Copa, não terá nomes como Rakitic, que fechou sua conta na seleção, e Mandzukic, que já parou com esse negócio de jogar bola, mas tem Pasalic, Perisic, Kovacic, Vlasic e, principalmente, Modric, que tem jogado muito mais do que 2018, quando ganhou a Bola de Ouro. 

A Seleção de Marrocos, que ficou em último lugar em seu grupo em 2018, mas jogando melhor nos três jogos, vem de uma campanha honesta na Copa Africana de Nações, quando caiu nas quartas-de-final para o Egito, na prorrogação. No entanto, o treinador, o bósnio Vahid Halilhodzic, afastou Harit, Mazraouri e até o craque da equipe, o atacante do Chelsea Ziyech, que são "só" alguns dos principais jogadores, o que enfraqueceria qualquer equipe. Tem o excelente Hakimi, do PSG, mas não parece suficiente para avançar em um grupo tão equilibrado. 

Canadá é a atração do torneio na sua segunda disputa de Copa do Mundo, mas a primeira com jogadores de nível decente. Muito decente, aliás, como Stephen Eustáquio, que chegou ao Porto após grandes partidas pelo Paços de Ferreira; Jonathan David, jogador do Lille; Buchanan, do Bruggee; e, obviamente, aquele que é possivelmente o melhor lateral esquerdo da atualidade, o estupendo Alphonso Davies, do Bayern. A inexperiência pode cobrar o preço, mas é um time suficientemente bom para muito mais do que (não) fez em 86, quando deixou o Mundial sem nenhum golzinho marcado sequer, quando jogou o torneio até com jogadores do "soccer indoor", uma espécie de showball.

Palpite do editor: o grupo F tem o maior potencial para causar surpresas, mas, pela inexperiência canadense e pela falta de um ambiente interno decente em Marrocos, Bélgica e Croácia devem passar. 

23/11 (quarta-feira)
Bélgica x Canadá - 16h
Marrocos x Croácia - 7h
27/11 (domingo)
Bélgica x Marrocos 10h
Croácia x Canadá - 13h
01/12 (quinta-feira)
Croácia x Bélgica - 12h
Canadá x Marrocos - 12h

Grupo G
Brasil (1º)
Suíça (14º)
Sérvia (25º)
Camarões (37º)

Após roçar a perfeição nas Eliminatórias, o Brasil voltou a liderar o ranking de seleções da FIFA, o que não significa absolutamente nada além de servir para o torcedor brasileiro reclamar quando não é o primeiro e desdenhar quando é. O trajeto do único presente em todas as fases finais do Mundial e único cinco vezes campeão teve dois momentos: o primeiro foi de aborrecer, pragmático e sem brilho, mas com vitórias a dar com pau até garantir matematicamente a vaga; o segundo, com testes e chances para mais jogadores e deixando de lado até então intocáveis, deu ao técnico Tite material suficiente para pensar em algo mais do que empacar no primeiro europeu bem organizado que lhe calhar no mata-mata, como tem sido desde 2006. E o melhor de tudo: há vida, e muita, sem Neymar. Há Coutinho, Paquetá, Raphinha, Vini Jr, Thiago Silva, Marquinhos... bom, há muito como há muito tempo não se via.

O grupo dos reencontros tem duas seleções que estiveram no caminho já na primeira fase de 2018. E são chatas até dizer chega: Suíça e Sérvia. Coincidentemente, as duas mandaram para o limbo da repescagem a Itália, que ficou por lá, e Portugal, que se safou da vergonha de não chegar à Copa. Só isso já faz que sejam adversários que merecem respeito. Os alpinos, por exemplo, já haviam mandado a favoritíssima França para casa na Eurocopa. O duelo entre eles, marcado para a última rodada, tem potencial de gerar faísca por dois motivos: a provável disputa por uma das vagas e que deve ser a segunda, e, principalmente, pela questão geopolítica que já incendiou o último encontro entre as seleções, vencido pelos suíços por 2 a 1, com direito ao gol da virada ser marcado no último minuto e com o autor, Shaqiri, repetir o gesto que já havia sido feito por Xhaka, que empatou: as mãos simbolizando a águia de duas cabeças, presente na bandeira da Grande Albânia, área desmembrada entre os países da ex-Iugoslávia após as Guerras Balcânicas. Os dois, inclusive, seguem na seleção e têm a boa companhia de gente como os zagueiros Akanji e Elvedi, o ótimo meia Freuler e os atacante Embolo, Zuber e Seferovic, que fez dois dos três gols que ajudaram a despachar a França na Euro. A Sérvia também tem um poder de fogo respeitável, com a máquina de fazer gols da Championship Mitrovic (marcou o tento que jogou Portugal no tacho do capiroto em Lisboa), os ótimos Milinković-Savić, Tadic e Vlahovic, além de outros bons valores espalhados pelo campo.

E tem Camarões, que volta à Copa após falhar a presença em 2018. Os Leões Indomáveis estão novamente no grupo do Brasil, como em 2014, e o destino tem tudo para ser o mesmo: voltar para casa após três jogos. Como sempre, não é um exemplo de organização, tendo trocado de treinador após cair na semifinal da CAN, que era disputada em casa (e nem foi por 7 a 1), para o Egito. Saiu o português Toni Conceição e chegou o lendário Rigobert Song para realizar o milagre da classificação. Com Toni, já havia surpreendido ao terminar na liderança o grupo que tinha Costa do Marfim, mas o drama mesmo estava na repescagem: perdeu em casa por 1 a 0 para a Argélia de Mahrez, que tem muito mais time, para vencer fora e se classificar pelo já obsoleto critério do gol qualificado, ganhando por 2 a 1 após sofrer o gol de empate, que o eliminaria, aos 14 minutos do segundo tempo da prorrogação. O milagreiro, Ekambi, que joga no Lyon, também é um dos destaques do time. Também merecem atenção Choupo-Moting, do Bayern, o excelente Anguissa, do Napoli, e o instável, mas bom - ou o contrário, dependendo da boa vontade de quem lê - Onana, do Ajax.

Palpite do editor: grupo sob medida para o Brasil passar com alguma dificuldade, elevando o nível de competitividade para chegar em bom nível para o inevitável mata-mata. O pau deve torar pela segunda vaga, com uma leve tendência para a Sérvia avançar, apesar - ou talvez por isso - da minha torcida contrária. Camarões, que deve ter esgotado seu estoque de milagres, fica por aqui.

24/11 (quinta-feira)
Brasil x Sérvia - 16h 
Suíça x Camarões - 7h
28/11 (segunda-feira)
Brasil x Suíça - 13h
Camarões x Sérvia - 7h
02/12 (sexta-feira)
Camarões x Brasil - 16h 
Sérvia x Suíça - 16h

Grupo H
Portugal (8º)
Uruguai (13º)
Coréia do Sul (29º)
Gana (60º)

Da repescagem diretamente para o pote 1 do sorteio, Portugal deu caldo verde para azar, mas calhou-lhe um grupo que, se não promete facilidades, tem o mesmo condão de obrigar-lhe a estar em alto nível desde o início para não registrar uma nova campanha decepcionante pelo material que tem, ainda mais tendo a concorrência do Uruguai, que despachou a turma da caneta na orelha ainda nas oitavas-de-final na Rússia. Com Cristiano às portas da sua quinta Copa, tem uma defesa cujo eixo central ainda depende do interminável Pepe, mas formaria dois ou até três times muito competentes do meio para a frente. Talento não falta e quase todos atuam nas grandes ligas. O que falta é Fernando Santos encontrar uma forma para privilegiar um dos elencos mais fortes do mundo. Com a faca no pescoço e contra as inferiores Turquia e Macedônia do Norte, conseguiu. Em todo caso, não é bom duvidar de quem tem, além do CR7, Rúben Dias, Bernardo Silva, Diogo Jota, João Cancelo, João Félix, João Moutinho e Bruno Fernandes, só para ficar em alguns. Quem quiser desdenhar também pode, afinal, só quando chegou às semifinais é que Portugal venceu mais do que um jogo por Copa que disputou. Convenhamos, é um retrospecto fraquinho para quem tem o cartaz que tem.

A grande história desta chave, porém, é o reencontro entre Suárez, provavelmente em sua última Copa, e Gana. Para quem não sabe - o que seria imperdoável - ou não se lembra, os ganeses estiveram às portas de serem os primeiros africanos a chegarem às semifinais da Copa, em 2010. Para isso, bastava o craque do time, Asamoah Gyan, converter o pênalti que Suárez cometeu ao meter a mão na bola praticamente em cima da linha no último minuto da prorrogação. Ele acertou o travessão, o Uruguai venceu noa pênaltis com cavadinha do Loco Abreu e Luisito tornou-se herói nacional.

Heroísmo à parte, o Uruguai renasceu após estar praticamente desenganado nas Eliminatórias, quando trocou o lendário Maestro Óscar Tabárez, desde 2006 no cargo, por Diego Alonso e vencer os quatro últimos jogos. Há os intermináveis e perigosíssimos Cavani-e-Suárez, além do superbeque Godín, mais uma série de grandes nomes abaixo da casa dos 30 anos, como os zagueiros Araújo e Gimenez, o lateral Viña, os meio-campistas Torreira, Betancur, Ugarte e De Arrazcaeta, além da máquina de gols Dárwin Nuñez, que deve herdar a camisa 9 - ou a 14 - após o Mundial.

A Coréia do Sul, que não havia feito nada que prestasse em Copas até co-sediar a de 2002 e ser levada pela arbitragem até a semifinal, tem o espetacular Son, do Tottenham, como grande nome da história do futebol sul-coreano, e tem o apoio de Hwang, do Wolverhampton, para que não se diga que o camisa 7 joga sozinho. Ok, Kim, do Fernerbahçe, não é de se jogar fora, mas não parece ser o suficiente para que Paulo Bento possa levar o país ao menos a igualar 2010, quando caiu nas oitavas-de-final.   

O mesmo fado deve ser cantado pela seleção de Ganaque não esteve na Copa da Rússia e precisou eliminar a favorita Nigéria no gol qualificado para voltar aos mundiais. As Estrelas Negras, que de estrela mesmo só têm o Thomas Partey, do Arsenal, além dos bons Djiku, zagueiro do Strasburgo, do meia Kudus, que defende o Ajax, e de Afena-Gyan, "descoberta" de José Mourinho na Roma, não devem fazer muito mais do que sonhar com uma vitória contra os asiáticos do grupo e, porventura, atrapalhar os planos de portugueses e uruguaios. 

Palpite do editor: apesar da possibilidade de zebra aqui ser considerável, não dá para não imaginar Portugal e Uruguai chegando às oitavas. A saber, quem estará no caminho do Brasil. A aposta aqui é que haverá clássico sul-americano valendo vaga para as quarta-de-final.

24/11 (quarta-feira)
Portugal x Gana - 13h
Uruguai x Coréia do Sul - 10h
28/11 (segunda-feira)
Portugal x Uruguai - 16h
Coréia do Sul x Gana - 10h
02/12 (sexta-feira)
Coréia do Sul x Portugal - 12h
Gana x Uruguai - 12h

sexta-feira, 1 de abril de 2022

PORTUGUESA - Só falta um poucochinho, Lusa

Ok, perdoe a dancinha mal lograda. O time tem cara e jeito de
 que está pronto para subir (Ronaldo Barreto/NetLusa) 

Ao vencer o Primavera em uma partida com mais segurança do que brilho, pelas quartas-de-final do Paulistão A2, a Lusa ficou a um adversário de voltar à elite. Esta é a boa notícia. A ótima notícia é que o time parece estar pronto para isso. Quem tem acompanhado este blog tem visto que uma das suas preocupações (a maior delas) era a Portuguesa chegar ao mata-mata nas melhores condições físicas e psicológicas possíveis para os jogos de caráter decisivo.

Como também já foi apontado aqui, há um tabu a ser quebrado, o de o líder da primeira fase não subir. Afunilando um pouquinho mais, é possível ver que todos os que chegaram ao mata-mata com a melhor campanha caíram nas semifinais. Todos, sem exceção. E isso pode ser um indicativo de que pode ter havido um descuido na preparação em que o jogo a jogo foi tão importante quanto chegar bem à fase aguda.
Não é assim.
Desde que o mundo é mundo e o futebol é futebol, o torcedor não compreende que é possível, provável e até desejável que exista uma oscilação. É uma questão física. Deve haver espaço para tensionar, afrouxar, soltar, maturar. Lutar contra isso é querer evitar que as ondas quebrem no mar. Elas quebram como o torcedor torce, cobra e fica feliz quando os resultados positivos acontecem.
É o verbo correto a ser usado quando se trata da relação com o torcedor: acontecer. Para quem planeja o dia-a-dia e tem a obrigação de saber como as coisas funcionam – ou emperram, pois é necessário conhecer também os fatores que dificultam o processo -, o verbo é outro: resultar. As coisas acontecem simplesmente porque acontecem e resultam porque existe uma série de condições com poder de interferência direta. O acaso é um deles.
E o acaso é o único que foge ao controle. O papel dos envolvidos é diminuir ao mínimo possível o poder de interferência da sorte e do azar. E isso só é possível com domínio dos processos, poder de síntese e de transmissão deste conhecimento, trabalho e apoio.
O preparador físico Kaio Soares disse ao NETLUSA que o elenco atingiu o ápice físico, técnico e psicológico, exatamente como era preciso. Em um campeonato tão nivelado como este, detalhes da preparação podem significar o tal controle maior ou menor sobre o impacto de um erro individual, de uma marcação equivocada do árbitro, de um único lance fortuito em uma bola parada. Enfim, do acaso. E é exatamente isso o que pode representar o passo que falta para que, sete anos depois e milhas e milhas distante, a Lusa volta para casa.
Texto originalmente publicado no NETLUSA