quinta-feira, 21 de março de 2019

Messi ou Ronaldo? Pelé!

(Fotos: Getty Images. Montagem: Placar)

Vira e mexe, aparecem polêmicas que tentam comparar jogadores diferentes, de épocas diferentes, e vaticinam que este é melhor que aquele e pronto. A mais nova é sobre o melhor jogador de todos os tempos – ou GOAT (Greatest Of All Times, de acordo com o estrangeirismo comum das redes sociais): Messi, Cristiano Ronaldo ou Pelé.

O estopim foi a fase de oitavas-de-final da Liga dos Campeões, quando Cristiano passou por cima do Atlético de Madri e fez os três gols que classificaram sua Juventus aos quartos da competição. Um luxo! A resposta de Messi foi uma atuação de gala (mais uma) no passeio sobre o Lyon, completada na soberba partida feita na goleada sobre o Bétis, pelo Campeonato Espanhol. 


Nada de novo, portanto, do que ambos já vêm fazendo há quase uma década e meia.

O duelo entre eles é o que há de mais bonito no futebol mundial e ninguém, atualmente, sequer está próximo do nível dos dois. O português é o maior artilheiro da Liga das Campeões da UEFA, torneio que conquistou em cinco oportunidades, o mesmo número de Bolas de Ouro que possui. Cinco também tem o argentino, que venceu a maior competição de clubes do mundo quatro vezes. Isso fora o que fazem semana após semana, o que não é pouco, ainda mais se considerarmos os seus feitos, com marcas superadas aos montes, hat-tricks empilhados e atuações monumentais nos principais palcos do mundo.

Aí vem a questão: já superaram o Rei? Bom, vamos a alguns fatos: Pelé, na maior competição do futebol, a Copa do Mundo, tem três títulos em quatro disputadas, o mesmo número de copas que tiveram Messi e Cristiano em campo. Messi, finalista em 2014, tem seis gols pelo torneio, todos na primeira fase; Cristiano, semifinalista em 2006, quando foi um jovem coadjuvante do time que tinha Figo e Rui Costa como principais expoentes, tem um a mais, e nenhum a partir das oitavas. Pelé, que fez 12, só na Copa de 58 anotou seis, três deles na semifinal com a França e dois na final, sobre a Suécia, que sediava aquela edição, a primeira vencida por um país de outro continente. Pelé, então coroado Rei, tinha 17 anos. É verdade que ele teve companheiros de seleção bem melhores ao longo da vida, mas ele era o melhor entre eles.

Há quem diga que Pelé enfrentou jogadores menos capazes do que a dupla de antagonistas do Século XXI, que “o Paulistinha nem se compara com com La Liga ou com a Champions”. Ora, entre os anos 1950 e 1960 – que concentram as três primeiras conquistas mundiais pela Seleção, fora o bicampeonato mundial de clubes do Santos, em 62/63 –, os melhores estavam aqui. Todos os campeões das Copas de 58 e 62 disputavam o Rio-S.Paulo, torneio em que Pelé deitava e rolava, como fazia em todos. Nem na Copa de 70 havia um forasteiro sequer (somente cinco dos 22 vestiam camisas de clubes de fora do chamado eixo Rio-São Paulo). Eis as listas:

1958:
Goleiros: Castilho (Fluminense) e Gylmar (Corinthians);
Laterais: De Sordi (São Paulo), Djalma Santos (Portuguesa), Nilton Santos (Botafogo) e Oreco (Corinthians);
Zagueiros: Bellini (Vasco), Mauro (São Paulo), Orlando (Vasco) e Zózimo (Bangu);
Meio-campo: Dida (Flamengo), Didi (Botafogo), Dino Sani (São Paulo), Moacir (Flamengo) e Zito (Santos);
Atacantes: Garrincha (Botafogo), Joel (Flamengo), Mazzola (Palmeiras), Pelé (Santos), Pepe (Santos), Vavá (Vasco) e Zagallo (Botafogo).  


1962:
Goleiros: Castilho (Fluminense) e Gylmar (Santos);
Laterais: Altair (Fluminense), Djalma Santos (Palmeiras), Jair Marinho (Fluminense) e Nilton Santos (Botafogo);
Zagueiros: Bellini (São Paulo), Jurandir (São Paulo), Mauro (Santos) e Zózimo (Bangu);
Meio-campo: Didi (Botafogo), Mengálvio (Santos), Zequinha (Palmeiras) e Zito (Santos);
Atacantes: Amarildo (Botafogo), Coutinho (Santos), Jair da Costa (Portuguesa), Garrincha (Botafogo), Pelé (Santos), Pepe (Santos), Vavá (Palmeiras) e Zagallo (Botafogo).


1970:
Goleiros: Ado (Corinthians), Felix (Fluminense) e Leão (Palmeiras);
Laterais: Carlos Alberto (Santos), Everaldo (Grêmio), Marco Antonio (Fluminense) e Zé Maria (Portuguesa);
Zagueiros: Baldocchi (Palmeiras), Brito (Flamengo), Fontana (Cruzeiro) e Joel Camargo (Santos);
Meio-campo: Clodoaldo (Santos), Gerson (São Paulo), Rivelino (Corinthians) e Piazza (Cruzeiro);
Atacantes: Edu (Santos), Dario (Atlético Mineiro), Jairzinho (Botafogo), Paulo Cesar Caju (Botafogo), Pelé (Santos), Roberto Miranda (Botafogo) e Tostão (Cruzeiro).


Ou seja, este argumento, que tenta colar que os campeonatos europeus eram mais fortes que o Paulista e o Carioca, não se sustenta.

Há os que dizem que o futebol era muito mais fácil, que os sistemas táticos não eram tão fechados e que o futebol não era tão físico e veloz como é hoje. Não deixa de ser verdade, mas a tal facilidade é discutível: o esporte, como tudo no mundo, evoluiu. Se há menos espaços, e não há folga em campo mesmo, as condições são bem melhores. Pelé pegou gramados ruins, equipamentos rústicos, bola pesada e uma época em que a medicina esportiva era incipiente, além do fato de o jogo ser mais violento, sem tantas câmeras pegando as pancadas que os jogadores trocavam. Messi e Cristiano, por sua vez, têm à disposição uma equipe de profissionais,  tratamentos e aparelhos que atenuam o desgaste físico e aceleram a recuperação entre as partidas, programas de computador que ajudam a analisar o desempenho, bolas que começam e terminam o jogo com o mesmo peso, gramados em perfeitas condições, uniformes que não retêm suor, não terminam o jogo empapados ou, como a pelota, com uma parcela da chuva que eventualmente tenha caído.

Alguns fatores favoreceram o Rei, é bom pontuar. O principal deles é que ele, assim como Messi, vestiu a mesma camisa durante toda a carreira (a passagem pelo Cosmos aconteceu após a despedida oficial pelo Santos), não precisando se adaptar a novas formas de jogo e à vida em outros sítios. Nos dias de hoje, e isso é um ponto a favor do argentino, é praticamente inimaginável que Pelé permanecesse no Santos.

Da mesma forma, não resta dúvida de que o Rei seria um jogador ainda mais completo, uma vez que o talento é nato. Pelé, que media 1,72m (achou que fosse mais alto, né?), provavelmente seria mais alto e mais forte, considerando o resultado da sua aplicação, combinada com a evolução humana e os avanços em todas as áreas, incluindo a esportiva.

Temporada após temporada, Messi e Cristiano se reinventam, tornam-se melhores porque Messi é e Cristiano faz de tudo para ser, e consegue. Um é arte pura. O outro, obstinação. E a pergunta inevitável é a seguinte: como seria um jogador com o talento de Messi e a determinação de Cristiano? 

A resposta é simples: este é Pelé.

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