domingo, 20 de abril de 2014

O esporte perdeu a alma

Morreu Luciano do Valle. Não um narrador. Quem partiu foi um precursor. Deixamos de ser o país só do futebol graças a ele, que não só idealizou o Show do Esporte, na Bandeirantes, como o transformou em sucesso absoluto. Para quem não sabe, o Show do Esporte era uma programação de oito, dez horas, inteirinha só de esportes na TV aberta: futebol italiano, vôlei, basquete, Formula Indy, sinuca (sim, senhor: sinuca), boxe. Luciano do Valle plantou a sementinha que transformou o voleibol em esporte de massa. Ele trouxe e despertou o gosto do brasileiro pela NBA, mesmo havendo um brasileiro, se muito, jogando por lá, e era o pivô Rolando. 

Descobrimos e passamos a gostar do futebol europeu a partir do calccio. O Napoli de Careca e Maradona, o Milan de Gullit, Rikjaard e Marco Van Basten e a alegria de ver que era possível jogar futebol em lugares que não fossem as pocilgas dos estádios do Brasil, como o Giuseppe Meazza (ou San Siro, como queiram), o San Paolo e o Delle Alpi. 

E quando ele formou a seleção de Masters? Que ideia foi aquela! Cafuringa, Rivelino, Edu Bala, Ademar Pantera, Edu, Mario Sérgio, Pelé! Craques que o tempo nos sonegou a possibilidade de ver, como numa máquina do tempo que nos trouxe de volta o brilho de tempos dos quais sentíamos saudade, mesmo sem nunca tê-los vivido. 

A voz que se calou na tarde do estúpido dia 19 de abril (o mesmo em que, 20 anos antes, desaparecia dos campos a arte de Dener) não escapou da arrogância dos censores das redes sociais, que dá voz a bobos cada vez mais bobos. Cada erro cometido numa transmissão virava piada, virava pilhéria, feita por gente sem a menor competência para tentar ter um pouquinho só da importância que teve Luciano do Valle.

Em 1982, ano da mágica Seleção de Telê, Luciano do Valle era o maior locutor esportivo da TV brasileira, uma espécie de Galvão Bueno, mas sem a idiota rejeição que o número um da Globo tem nos dias que correm. Era completo. Era absurdamente completo. 

O esporte, cada vez mais comercial e sem sentido, agora perdeu a alma. Morreu Luciano do Valle. 

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