sábado, 19 de abril de 2014

O supercraque da camisa 10



Naquela noite fria de quarta-feira do outono paulistano, o placar apontava um empate insosso sem gols entre Portuguesa e Internacional de Limeira, pela segunda rodada da segunda fase do Campeonato Paulista de 1991, quando, já perto do final do jogo o time do interior teve um escanteio pela direita do campo de ataque, para o lado do gol dos vestiários do Canindé. O tiro de canto, mal batido, foi interceptado por Wladimir. Nilson, o centroavante do time, ajeitou a bola para Dener, que vinha em velocidade na altura do grande círculo do meio-de-campo.


Como um bólido, partiu com a bola dominada e foi superando os adversários, um por um: primeiro Ivan, driblado em velocidade, na passada; depois, um drible da vaca em cima do zagueiro Lica. Denis, lateral-esquerdo, veio babando para aplicar uma tesoura, mas o arisco camisa 10 luso nem tomou conhecimento, para, da marca do pênalti, apenas tirar, com um toque sutil do lado direito, o goleiro, que tentava em vão fechar o ângulo. Na mesma noite, todos os telejornais (em 1991 a internet não era acessível como hoje) davam destaque ao gol de placa marcado no Canindé pelo menino que, menos de um ano antes, encantara (vestindo a mesma camisa oito que foi imortalizada por Enéas) o país na histórica conquista da Taça São Paulo de Futebol Júnior.


Dener era assim: criava oportunidades de gol do nada, em jogos em que parecia que não aconteceria mais nada. Ele foi um dos últimos gênios do futebol brasileiro. “Meia à moda antiga, criava chances de gol a partir do nada”, constatou o guia do Campeonato Brasileiro de 1993, da revista Placar. “O melhor do mundo. Morreu antes do reconhecimento”, disse certa vez Edinho, ex-goleiro do Santos e um dos grandes amigos do genial jogador, com a autoridade de quem é filho do Rei Pelé. Dos inúmeros sucessores do Rei, foi o que mais mereceu tal alcunha. Como se não bastasse, Pepe, que jogou com Pelé na Seleção e no Santos e foi técnico do craque luso, decreta em entrevista ao site Globoesporte.com: "Foi um dos cinco melhores atacantes que eu vi, e olha que eu vi Pelé, Eusébio, Puskas... Dener está neste rol".

Vestindo a camisa dez da Portuguesa, Dener brilhou intensamente. Como craque que foi, esteve acima de qualquer rivalidade, pois até os adversários renderam-se diante do seu imensurável talento. Quando ele se foi, seu nome ecoou por todos os estádios do país do futebol, não importando quais times estivessem em campo. Acima do bem e do mal, no coração e na saudade de todos, naquele momento, estava o nome de Dener.



Quando morreu, naquela estúpida madrugada de 19 de abril de 1994, Dener estava no banco do carona do seu Pássaro Branco, que era como ele chamava o seu Mitsubishi Eclipse branco, de placa DNR-1010. No momento em que Oto Gomes de Miranda, que conduzia o carro, colidiu numa árvore na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, Dener dormia. Se estivesse acordado, certamente teria dado um drible na morte.

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