quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Portugal 7 x 0 Andorra - um desperdício de isotônico



Em um calendário que enfia trinta e poucas jornadas nos campeonatos nacionais, fora as copas e os compromissos internacionais dos clubes, por que não inflá-lo ainda mais com amistosos entre seleções que pouco ou nada contribuem para a preparação das equipes? Grande ideia, não?

Bom, isto já foi falado aqui mesmo. Então, vamos ao jogo, ou melhor, o desperdício de isotônico que foi o Portugal x Andorra. Não é apenas um modo de falar: sem querer menosprezar a boa vontade dos gajos - que deixaram por um ou dois dias as compras sem impostos, as boutiques e joalherias, as estações de esqui e os vinhos de sua terra, encrustada na fronteira entre Espanha e França, para servirem de sparrings para os gajos de Portugal -, seria mais útil um treino com cones estáticos.

Com 11 reservas em campo, Fernando Santos usou a obrigatoriedade do jogo para gerir esforços e para dar chances aos novos. Então havia Paulinho e Pedro Neto. E havia os que buscam convencer o mister que podem estar no autocarro da Selecção, como Domingos Duarte, Renato Sanches, Trincão, Rúben Semedo e Sérgio Oliveira. E, dependendo da mansidão dos de Andorra, diminuir a distância do Cristiano ao iraniano Ali Daei na cimeira dos artilheiros de seleções.

Aí, nem vale a pena se debruçar no comportamento tático de quem enfrentou um adversário com oito jogadores em um campeonato que terminou há quase quatro meses, dois em divisões menores da Espanha e um de uma liga secundária dos Estados Unidos, organizados em tese num 5-3-2 contra o 4-3-3 português, mas que estava sempre com pelo menos sete atrás, e Portugal que se virasse pra achar os espaços.

Ora, não era uma das missões mais difíceis, tanto que Pedro Neto já meteu gosto ao pé ao sétimo minuto, em um gol que mais parecia aquela brincadeira em que três enfrentam um goleiro e o golo só vale se a bola não tocar no chão. Semedo cruzou, Paulinho escorou no segundo pau, Sérgio Oliveira amorteceu e Neto soltou o sapato, sem nenhum protesto dos visitantes.

Com a passadeira livre para Semedo correr o quanto quisesse por ali, ele foi à frente e atirou para outro estreante ser feliz: Paulinho se antecipou e bateu no canto de um Josep Gomes cuja única dúvida era saber quantas vezes teria que buscar a bola nas redes. E o primeiro tempo serviu só para isto mesmo.

Como estava fácil e não havia sequer as botinadas de quem mal conseguia tocar à bola, e nisso Andorra poderia ser condecorada pelo excessivo fair play, Cristiano Ronaldo foi a campo para aumentar sua coleção de 101 golos por Portugal no jogo em que já era certa a sua 100ª vitória. Mas era um Cristiano perdulário à frente do gol, desperdiçando ao menos três chances antes de receber o cruzamento perfeito de Mário Rui para marcar de cabeça naqueles lances em que parece parar no ar. Este foi o sexto golo da seleção no jogo, que já havia marcado novamente com Paulinho, Renato Sanches e Emili Garcia contra a própria baliza, a interromper o passe teleguiado de Bernardo Silva para o CR7.

No fim, ainda houve tempo para João Félix matar a saudade de balançar as redes do Estádio da Luz, em um jogo que terminou com quase todos os titulares do meio para a frente em campo (somente Bruno Fernandes não jogou). Fora isso, um pênalti não marcado em Cristiano, um golo mal anulado de William Carvalho e algumas garrafas de isotônico que poderiam ter ficado na geladeira, mas foram usadas na maior goleada de sempre frente ao praticamente inexistente oponente.

Ao menos ninguém se machucou para sábado, que é quando vale.

Antony Lopes: podia ter colocado as séries no Netflix em dia, mesmo no relvado;
Nelson Semedo: não nos faz bem ver um gajo que sabe jogar à bola a usar uma camisola vermelha no Estádio da Luz e lembrar que, na semana que vem, estará lá o Gilberto;
Rúben Semedo: podia tentar marcar um golito pra me ajudar a ter o que escrever; 
Domingos Duarte: só não foram 90 minutos inúteis na vida dele porque fez a estreia na Selecção. E também porque pode mostrar ao mundo a barba e o penteado que ainda não consegui decifrar do que se tratam; 
Mário Rui: escuta lá, pá. Dois dos golos saíram de cruzamentos teus, daqueles perfeitos. Teria como ensinar o Nuno Tavares?
Renato Sanches: ok, era um jogo contra ninguém, mas como é bom ver o Renato a desesperar os idiotas que deram-no como acabado (William Carvalho: era preciso mesmo um dos melhores trincos do mundo entrar?);
João Moutinho: tenho para mim que ele jogará até os 70 anos e parecerá que tem 25. É um mistério (Danilo: a fleuma do Comendador, que enfrenta adversários portugueses, franceses e andorrenhos com a mesma disposição. Nem era preciso tanto. Bom, não era preciso nada, nem este jogo); 
Trincão: parece que temos aí talento para quando o Moutinho parar, mas parece que o Moutinho não vai parar nunca (Diogo Jota: como me fazes três pelo Liverpool na Liga dos Campeões e passas em branco num jogo destes, pá? Se estiveres a guardar para sábado, tudo bem);
Sérgio Oliveira: o Lorenzo Lamas de Portugal vive os melhores dias da carreira. A se lamentar, somente saber que na semana que vem estará a dar passes ao Marega (Bernardo Silva: jogos como este são bons para que vistas vermelho na Luz e te prepares para voltar à casa);
Pedro Neto: o primeiro jogador que nasceu no ano 2000 a jogar pela Selecção. Não é uma informação muito útil, mas o jogo também não era (Cristiano Ronaldo: podias ter metido lá uns três ou quatro golos, mas não ficava bem somar tantos na luta pelo recorde. Iam falar. Sempre falam. Ah, parabéns pela centésima vitória. Ou melhor, 100ª, que escrito assim soa melhor);
Paulinho: contrariou a tradição portuguesa de centroavantes ruins. Era bom ver se não erraram a nacionalidade dele (João Félix: não sei se estava pronto para vê-lo fazer um daqueles golaços na Luz, ainda mais a usar uma camisola encarnada. Não demore a voltar, Joãozinho).

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