sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Um trabalho sujo

* por Vinícius Carrilho

Um dos grandes sucessos da TV mundial é o programa Trabalho Sujo, apresentado e produzido por Mike Rowe. No Brasil, a série é transmitida há tempos pelo canal pago Discovery e também pela TV Bandeirantes, porém, neste último canal, em pequenos trechos. A ideia do programa é simples: mostrar os piores empregos do mundo.

Toda esta apresentação foi necessária para que de fato começasse a desenvolver o assunto inicial deste texto. Se algum dia encontrasse Mike Rowe pela rua, daria uma sugestão de emprego para que ele colocasse em seu programa. Sem dúvidas, falaria ao americano que uma das piores profissões do mundo é ser técnico da Seleção Brasileira de Futebol.

Escolher os melhores jogadores do Brasil parece ser um trabalho fácil, porém torna-se um verdadeiro martírio quando se tem mais de 190 milhões de patrões, sendo que a grande maioria é de uma incoerência digna de estudos. A começar pelo fato de que todos batem no peito e dizem não estão nem um pouco interessado na Seleção Brasileira, porém não é bem assim que as coisas são.

Comece pensando nos acontecidos pós Copa do Mundo de 2002. Parreira assumiu a Seleção Brasileira após um grande trabalho no Corinthians. Credenciado por sua longa carreira no futebol, tinha em mãos uma equipe repleta de bons jogadores, todos já com bagagem no mundo da bola. Reeditando a dupla tetracampeã do mundo com Zagallo, o treinador viu seus comandados conquistarem uma vitória heroica na Copa América de 2004 e ressurgirem das cinzas na Copa das Confederações de 2005, passando por equipes como Alemanha e Argentina após uma derrota para o México e um empate com o Japão na primeira fase.

Chegou então o ano de 2006 e o Brasil aparecia como a melhor equipe da Copa do Mundo da Alemanha, muito pelo chamado “quadrado mágico”, formado por Ronaldinho Gaúcho, melhor do mundo por duas vezes; Kaká, grande estrela do Milan; Ronaldo, o fenômeno e herói da última Copa do Mundo; e Adriano, ainda considerado o Imperador de Milão. Parreira não titubeou, atendeu ao apelo de seus 190 milhões de incoerentes patrões, que na época exaltavam essa grande equipe, e os colocou em campo. Porém, a magia do quadrado desapareceu e o Brasil acabou eliminado daquela copa por um gênio, que atende pelo nome de Zinedine Zidane. A partir deste momento, todas as conquistas anteriores foram esquecidas e então Parreira, de grande criador do quadrado mágico, passou a ser considerado velho demais por seus patrões. Resultado: deixou o comando da Seleção Brasileira.

Os patrões, que clamavam por renovação na comissão técnica e no time titular, tiveram mais uma vez seu pedido atendido. Dunga, em seu primeiro trabalho como treinador, chegava ao comando da Seleção Brasileira e promovia uma renovação moderada. Nomes conhecidos, como os de Júlio César, Lúcio e Kaká receberam a companhia de nomes até então desconhecidos, como os de Afondo Alves e Felipe Melo. A pressão sob o treinador começou aí e ele foi resistindo, vencendo a Copa América e a Copa das Confederações. Chegava então 2010.

A Copa da África do Sul começou com algum susto para o Brasil, após uma vitória magra por 2 a 1 sobre a Coréia do Norte. Na sequência, um trunfo sobre a Costa do Marfim e um empate com Portugal deram ao time o primeiro lugar do grupo. Nas oitavas, o Chile foi presa fácil e então chegou a Holanda. Com uma falha de Júlio César e uma expulsão de Felipe Melo (que antes havia dado a assistência para o gol de Robinho), a Seleção Brasileira estava mais uma vez fora do mundial e os dias de Dunga, que acabava de perder seu primeiro campeonato profissional, contados. Os patrões demitiam mais um treinador.

Então era a vez de Mano Menezes desempenhar um dos piores trabalhos do mundo. Vitorioso no Corinthians, o jovem treinador chegava credenciado também pelo trabalho realizado do Grêmio, anos antes. Os patrões, mais uma vez, clamavam por renovação e Mano atendeu, trocando praticamente todos os outros antigos convocados do último mundial. A safra de atletas era uma das mais fracas dos últimos tempos, porém a média de idade do time caiu consideravelmente.

Em campo, o técnico colocou o que havia de melhor e todos os jogadores em suas posições de preferências, da forma como atuam em seus respectivos clubes. Até então se passaram dois anos desde a contratação de Mano e em duas competições (sendo uma os Jogos Olímpicos, formado por jogadores Sub23), duas derrotas.

Mais uma vez os patrões não perdoam e pedem o cargo do treinador, que realiza exatamente o que antes era pedido a ele. Mano Menezes sabe que a paciência dos inconstantes donos da Seleção Brasileira se esgotará em seu próximo revés e a Copa do Mundo de 2014, antes meta imposta ao mesmo, pode ser vista apenas pela televisão. A última reclamação por parte dos patrões foi a convocação do goleiro Cássio, considerado o melhor arqueiro da Copa Libertadores da América de 2012. Acusam o técnico de ter convocado o jogador por ele ser empresariado por Carlos Leite, também empresário de Mano Menezes.

É por essas e outras que indicaria este cargo para o programa de Mike Rowe. Parece ser impossível conseguir agradar tanta gente que não suporta uma derrota ou a ideia que seu produto já não tem mais a qualidade de outros tempos. Parece impossível imaginar que algum dia, após tantas atitudes tomadas e pouco resultado final, passem os patrões a entender que deve ser cobrado aqueles que de fato fazem o jogo, dentro das quatro linhas. E se encontrasse Mano Menezes, acho que apenas diria para ele: “mas que trabalho sujo esse que você arrumou, hein mano?!”.

* Vinícius Carrilho tem 21 anos, é estudante de Jornalismo, 
morador de Osasco e gostaria de ganhar a vida fazendo humor, 
mas escreve melhor do que conta piada.

1 comentário:

Anónimo disse...

E escreve demais esse morador de Osaco!