Texto originalmente publicado no Netlusa
No encontro entre dois times que não jogaram como sabem, venceu quem tentou vencer e, ao cabo, teve mais sorte (Foto: Lisi Niesner/UEFA/Getty Images) |
A concertina é o principal instrumento das tocatas dos ranchos folclóricos portugueses. Quanto aos demais, é prudente que o gajo que toca o cavaquinho saiba tocar o cavaquinho, como ao senhor responsável pelo bumbo pede-se a perícia necessária para não atravessar o ritmo.
Mas que raio tem a ver isso aí com o jogo de Portugal? Ora, tudo! Basta ver como a equipe entrou em campo e perceber que, se se tratasse do conjunto que acompanha os dançarinos, os instrumentos estariam trocados.
Prevendo uma linha de marcação capaz de pressionar a saída de bola lusa com Schick, Kuchta, Souček e Provod, Martinez escalou Portugal com três zagueiros e quatro (ou cinco) no meio e três (ou dois) no ataque. A surpresa era a presença de Nuno Mendes jogando terceiro central, pela esquerda. Assim, João Cancelo faria a ala de mesmo lado, com Diogo Dalot na direita, o que não é novidade. Quem dançou foi João Palhinha, de grande imposição física, para que Vitinha fizesse a saída de bola atrás dos marcadores.
“Jogadores mais técnicos para romper essa primeira barreira”, deve ter pensado o espanhol.
Com a bola, Nuno Mendes avançava como lateral e Cancelo tinha liberdade para vadiar pelo meio e Portugal passava a jogar num 4-3-3 para explorar os espaços que surgiriam depois que fosse superada a primeira linha de marcação. O problema é que a República Tcheca surpreendeu, chegando a ter até seis jogadores alinhados à frente da sua área, com os outros quatro mal cruzando a linha de meio-campo, e os atacantes Kuchta e Schick só sendo assim chamados na ficha do jogo.
Vocês já devem ter visto o episódio do Pica-pau envelhecido e amassando o bico quando tentava passar uma árvore. Foi a representação perfeita de Portugal no primeiro tempo: tentava o passe em profundidade e a bola batia e voltava, muito em função de o jogo pedir o passe a rasgar para um dos da frente receber em diagonal, mas o que havia era um excesso de carregadores de bola e avançados com pouca movimentação. Vitinha desfilava, Cristiano saia da área e buscava associações e o acerto do último quase não acontecia. O melhor passador, Bruno Fernandes, estava encaixotado pela marcação e a falta de movimentação dos gajos frente não ajudava em nada.
Para piorar, a segunda bola na defesa nos poucos momentos em que os tchecos afastaram o rabo da sua linha de fundo era deles. E foi assim que saiu o gol tcheco, no início do segundo tempo: dois cruzamentos seguidos, sete dos de vermelho na área e ninguém para impedir que Provod pegasse sozinho para inaugurar o placar.
Imediatamente, Rafael Leão – que ganhava todas as jogadas e as desperdiçava, uma a uma – e Diogo Dalot foram trocados por Diogo Jota e Gonçalo Inácio, respectivamente. Portugal assumia de vez o 3-5-2, mas sem improvisações e com laterais capazes de chegar ao fundo. E o empate veio com uma boa dose de: Bernardo Silva recuou as soberbo Vitinha, que cruzou no segundo pau, onde fechava Nuno Mendes. Stanek espalmou para a frente e encontrou a perna de um infeliz Hranác - que voltaria a estar ligado ao infortúnio dos seus. E foi justamente a tempo de impedir que uma pressão maior pesasse sobre Portugal, que seguiu criando pouco e, com o tempo, com o cansaço acusando.
Não sei se Roberto Martinez confia muito nos titulares e pouco nos suplentes que ele mesmo escolheu, mas a demora a voltar a trocar jogadores por mais frescura nas pernas teria feito inveja a Fernando Santos em seus dias mais, digamos, sonolentos. Só no minuto 90 é que atirou os seus à frente. Um pouquinho antes, em nova jogada pela direita, o penúltimo dos 29 cruzamento encontrou a cabeça de Cristiano Ronaldo, que atirou ao poste e sorriu ao ver Diogo Jota carregar a recarga também de cabeça para o gol, anulado por meio peito de CR7 à frente.
Quando tudo parecia definido e nos preparávamos a voltar ao velho hábito de sacar a calculadora à algibeira – ou a caneta à orelha -, a sorte decidiu soprar a careca de Martinez novamente: Pedro Neto e Francisco Conceição, o “espalha brasas”, mal haviam entrado e decidiram o jogo na única intervenção de ambos. O extremo do Wolverhampton ganhou a dividida pela esquerda, tal como Leão teria feito, mas passou tenso para área, onde haveria um desvio, como Leão não teria conseguido fazer. Hranác se enrolou todo com a bola e ela ficou às ordens do portista, que encheu o pé e carregou Sérgio Conceição para o grupo em que somente os italianos Enrico (o pai) e Federico Chiesa (o filho) estavam: o de marcadores na Eurocopa sendo pai e filho.
No próximo sábado, dificilmente a Turquia dará tanto campo a Portugal. Também não é razoável pensar que Vitinha será suficiente para segurar Çalhanoğlu, Kökçü e Arda Guler, ainda mais com tantos turcos a viverem na Alemanha, suficientes para transformar o Signal Iduna Park em uma sucursal do inferno para alguém que se demonstrou incapaz de reagir às adversidades tão logo apareceram.
Que a tocata de Martinez esteja ensaiada e com cada gajo com o instrumento de costume.
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As avaliações a seguir têm um certo exagero, galhofa e quase nenhuma base técnica. É favor não levar tão a sério.
Diogo Costa: apanhou uma chuva do caraças à toa. Espero que tenha tomado um bagaço após o jogo. Ajuda? Claro que não, mas nunca se deve dispensar um bagaço;
Rúben Dias: de tanto esperar algo acontecer ao pé de si, foi ter do outro lado para poder justificar os minutos em campo. Calma, pá! Contra a Turquia terás trabalho;
Pepe: é sério que o Villas-Boas dispensou o Pepe e mandou voltar o David Carmo? Olha, se quiser jogar na Lusa até os 50 anos, faço questão de buscar o gajo em Cumbica;
Nuno Mendes: convém lembrar ao mister que cinco centrais foram convocados e tu não és um deles, SFF (Pedro Neto: podes mostrar ao Rafael Leão como dar continuidade sem estragar a jogada?);
Diogo Dalot: quando fores dormir, ó, José Diogo, poderias pegar uns auriculares para fixar o mantra "posso tabelar e chegar ao fundo"? (Gonçalo Inácio: onde estavas durante a semana, que o mister escolheu outro? Faça assim, sente-se ao lado dele, ande ao pé do careca e ele não se esquecerá que tu és o gajo para jogar pela esquerda);
Vitinha: o gajo de Santo Tirso não sabe jogar mal (Francisco Conceição: primeiro toque na bola na sua primeira Euro para espalhar brasas e salvar a pele do professor Martinez em seu momento Roger Schmidt);
Bruno Fernandes: "Como é, pá? Algum puto vai se movimentar ou querem a pelota ao colo, car***? F***"", terá dito o senhor Bruno Miguel quando tentou, sem sucesso, achar alguém para um passe dos seus";
João Cancelo: dizem que o mister ficou admirado quando descobriu que o João Cancelo também pode jogar, e bem, pela ala direita (Nélson Semedo: entrou para poder participar da comemoração do gol da vitória como reconhecimento por não ter reclamado que deveria ter entrado mais cedo);
Bernardo Silva: é importante explicar ao mister que o fato de teres "e Silva" em seu nome não significa que és mais que um, então jogar sozinho na ponta não deve resultar, como nunca resulta;
Cristiano Ronaldo: interessante essa tática de bater um recorde por vez: primeiro, jogar em seis edições; depois, marcar em seis edições. Era bom já ser com os turcos, pá;
Rafael Leão: que seja providenciada uma lousa na concentração para que o Rafael Alexandre escreva cinquenta vezes "Devo olhar antes de passar a bola e buscar algum gajo com uma camisola igual à minha" (Diogo Jota: o tipo de atuação em que bastava acertar o nome de um companheiro para faze mais que o que saiu);
Roberto Martinez: experimente perguntar à malta em que posição eles jogam antes do treino, SFF.
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