sábado, 2 de outubro de 2010

Sobre a presunção

O São Paulo sempre foi tido como um exemplo de administração. O clube sempre se gabou de não precisar de parceiros para tocar o futebol, pois essa história de co-gestão não funciona no Morumbi. É consenso, inclusive em boa parte da imprensa, que o Tricolor é o clube brasileiro que melhor se adequou ao monstrengo chamado de Lei Pelé. Afinal, ninguém ganhou mais dinheiro transacionando jogadores do que o São Paulo (mesmo que, para isso, tenha o pessimo hábito de aliciar garotos da base de outros clubes). Enquanto os outros, pobres co-irmãos, têm em seus quadros os conselheiros, o presunçoso representante da nobreza paulistana também os tem, mas sob a pomposa alcunha de cardeais.
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Os são-paulinos são diferentes em tudo. Desdenham das fases iniciais dos campeonatos porque, para eles, o filé-mignón, a decisão, é o que interessa. É aí que batem no peito e lotam o Morumbi, "o maior estádio particular do mundo", segundo eles. Outro "diferencial" tricolor é a apresentação dos uniformes: times comuns as fazem ou na própria sede social ou em alguma grande loja de artigos esportivos. O São Paulo não! Seus concorridos eventos são realizados na Oscar Freire. É mais fashion, né?
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Essa conversa de que o São Paulo Futebol Clube está um passo além da concorrência até que era, de certa forma, verdade. Desde que a fórmula de disputa do Brasileirão mudou para os pontos corridos, quem melhor se houve foi o Tricolor. Este tipo de campeonato premia o time que for mais regular durante a disputa e, para tal, é necessário que haja planejamento, e o planejamento deve andar de mãos dadas com uma estrutura bem sólida, coisa que ele, o São Paulo, tem. Outro consenso é que o clube contrata com competência ímpar graças à excelente comissão técnica, que, aliás, é fixa. Um luxo no oásis de desorganização chamado futebol brasileiro.
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A grandeza de um clube é forjada através dos tempos. Como no Brasil o campeonato nacional é recente, se comparado a outros países, muito da história dos grandes clubes foi feita com os campeonatos estaduais. Com o advento do Campeonato Brasileiro, entretanto, já não bastava ser o melhor da sua rua. Tem que ser o melhor do bairro. Depois que competições internacionais como a Libertadores e o Mundial ganharam a projeção que têm, ser o melhor do país já não era tão importante assim. Agora deve-se ganhar o mundo. Outra coisa que não seja isso parece não ter importância.
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Eis o maior problema do São Paulo Futebol Clube. Depois que conquistaram a América - e o mundo -, os outros campeonatos passaram a valer menos do que nada. Em quase quarenta anos de disputa do Campeonato Brasileiro, o São Paulo é o único time a vencê-lo por três anos seguidos, sempre sob o comando de Muricy Ramalho. Como o treinador cometeu o pecado de não ganhar a Libertadores, foi enxotado do Morumbi. Não por coincidência, ninguém mais conseguiu emplacar um bom trabalho no clube.
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Há pouco tempo atrás, Rogério, o goleiro-craque-capitão-bandeira (sem ironia), disse que não conseguia imaginar o São Paulo fora da maior competição sulamericana. Um bom tempo depois foi a vez do boquirroto Carlos Augusto Barros e Silva dizer que a Copa do Brasil não está à altura do clube. Juvenal Juvêncio, o presidente, não é dos mais humildes. Eis que o São Paulo perdeu a mão não só nas contratações, mas no planejamento. Sob a ilusão de ser o sonho de todo jogador, sujeitou-se a virar reformatório de jogadores problemáticos, como Carlos Alberto e, principalmente, Adriano.
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Pelo visto, depois de seis anos consecutivos disputando a Libertadores, o time do Jardim Leonor terá que se contentar em juntar-se aos pobres e jogar a Copa do Brasil. Para tanto, terá que voltar a ser humilde, como nos tempos em que era treinado por um homem que, ao contrário dos que estão no comando do clube, sabia detectar limitações. Afinal de contas, não é só no dicionário que a arrogância aparece antes do fracasso.

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