Depois de tentar descansar, levantei-me da cama e me vesti respeitosamente. Meus olhos, vermelhos e inchados, denunciavam uma noite não mal dormida, mas em claro. Resolvi não colocar meus óculos escuros, pois não fazia a menor questão de escondê-los.
Saí calado, meditabundo. Nossas lembranças passavam em meus sentidos como um filme sem começo, nem meio, mas com final. Eu estava indo enterrar o amor.
Quando cheguei, cabisbaixo, pude notar nossos amigos todos lá. Queriam me confortar, cada um como podia, embora ninguém pudesse. Um abraço. Um gesto. Uma palavra. Ou o silêncio. Nada podia aliviar minha dor. Honestamente, preferi apenas ouvir o silêncio, pois não havia o que dizer, nem o que ouvir.
Nas paredes, coroas de flores homenageavam os momentos, alegres ou não. Afinal, o amor não está apenas nos momentos felizes. É na tristeza que ele tem o seu sentido em plenitude. Em momento algum me aproximei do féretro. Não era essa a imagem que eu queria levar na retina. A lembrança que eu quis cultivar era outra, a de um amor forte, eterno. E isso ele era mesmo. Forte como eu nunca imaginei poder sentir.
Claro que eu nunca fui prepotente a ponto de achar que era o maior amor que já se houve, mas eu não conheci outro tão grande quanto. Tudo bem, pode ser que o meu amor fosse como o rio que corta a aldeia do Alberto Caeiro, mas o fato é que era imensurável. Quanto maior é o amor, mais dolorosa é sua partida. O ocaso sempre é difícil. Custa-nos a alma admitir que ele está doente, que irá nos deixar, que está morrendo.
Quando a última pá de terra o cobriu, o único som que ouvi foi o que vinha do vazio do meu peito. Sequer vi alguém à minha volta. No mesmo silêncio, caminhei sozinho de volta para casa, tão vazia quanto meu coração. Lá chegando percebi o meu engano: o que eu enterrei foi a esperança; o amor voltou comigo.