sábado, 6 de janeiro de 2018

Um sopro de dignidade

Duas décadas depois, Zé Roberto volta a vestir-se de
rubro-verde (Fernando Dantas/Gazeta Press)
E Zé Roberto cumpriu sua promessa de dar seus últimos chutes com a camisa que usou nos primeiros. Uma volta tardia? Talvez. Uma esperança efêmera para uma torcida que virou alvo de chacota, piedade. Uma torcida que escolheu a difícil missão de apoiar um clube que por quase um século lutou para ser reconhecido como grande. Um clube que sucumbiu ante os próprios erros e a crueldade de um futebol que não dá espaço para quem não oferece grandes cifras, audiência ou nada além que a própria história ou o próprio orgulho por nunca desistir e que, nos dias que correm, trocou a luta por teimosia, agonia.

Particularmente, sempre esperei que o Zé voltasse ainda capaz de que seu canto do cisne durasse uma competição, pelo menos. Cheguei a praguejar, duvidar que sua gratidão não passasse de discurso vazio, mas como voltar tendo tanto a dar a quem não estava preparado para receber?

A cada descenso anterior à hecatombe de 2013, um lamento. "Ele poderia vir." Mas não viria assim. Decepção. Raiva. Como a vida muda, não sou capaz de julgar. Não mais.

Sua volta, enfim, aconteceu. Aos 43 anos, 20 após ter decolado para voos mais altos. Por dois jogos, num torneio amistoso de pré-temporada, mas por mais paliativo que possa ser, seu retorno faz a malta rubro-verde reviver, mesmo que por um momento, a sensação de grandeza que se perdeu quando a nau Portuguesa ficou à deriva, sem rumo, sem norte.

Como um Dom Sebastião que volta de Alcácer Quibir, Zé Roberto veste, talvez pela última vez neste domingo, a camisa que permitiu que sonhasse alto, grande. Grande como o sonho de uma torcida machucada, magoada, mas que voltou, na lágrima do velho Zé, a se sentir querida por um instante.

Talvez amanhã a realidade seja dura como a Quarta-Feira é de cinzas após a passageira alegria do Carnaval, como é triste o estádio, aos olhos de Eduardo Galeano, agora vazio quando o torcedor deixa de ser nós é passa a ser eu na volta para casa. 

Talvez o futuro seja negro como o xaile que descansa sobre os ombros da fadista que, com olhos fechados, enxerga com o coração e canta com a alma, a mesma alma que se sentiu grande e que por ela tudo vale a pena.


Mesmo que somente por dois jogos.

(Foto: Rafael Ribeiro)