quarta-feira, 22 de março de 2017

Vinicius Junior, a bola da vez

TEMPO DE MATURAÇÃO Vinicius Junior já é cobiçado por
 grandes da Europa (Foto: Vinicius Gregório)
“Vinicius Junior vai estrear no profissional antes de Neymar? Fla avalia”. Este é o título da matéria do ótimo Rodrigo Mattos, do UOL, sobre a mais nova promessa de craque do futebol brasileiro. Vinicius Junior, a bola da vez, tem 16 anos e idade de juvenil.
Brilhou na Copa São Paulo de Futebol Jr com o seu Flamengo, clube que orgulha-se da frase “Craque o Flamengo faz em casa”, embora não tenha feito tantos assim nos últimos anos. Seu brilho na competição durou enquanto o Rubro-Negro enfrentou catadões de qualidade duvidosa, times de empresários que empestearam aquela que era para ser a maior e melhor competição do futebol de base do Brasil, de onde saíram Falcão, Toninho Cerezo, Djalminha, Dener, Kaká e Neymar, mas hoje é um balcão de negócios dos mais ordinários. No primeiro obstáculo parrudo, sucumbiu.
Demérito algum para um menino de 16 anos.
Depois veio o Sul-Americano Sub-17, em que foi o principal destaque do título invicto da Seleção Brasileira e chamou a atenção de emblemas como Barcelona e Real Madrid, que, é o que se diz, não medirão esforços pelo garoto, cujo vínculo com o Flamengo vai até 2019 (menores de idade não podem assinar por mais de três anos e o Flamengo tenta, para julho, mês de aniversário do jogador, esticar o contrato até 2020).

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Já existe uma pressão desgraçada para que o time da Gávea inscreva o garoto nos campeonatos. Dirigentes flamenguistas adotam o discurso de que já viram histórias de joias que não foram lapidadas e acabaram se perdendo. Mattos, o jornalista, compara a trajetória dele com a de outro talento precoce, Neymar, tendo como base a idade de estreia no time principal. Neymar debutou no time de cima do Santos com 17 anos e um mês.


PRECOCE Neymar já era esperança aos 15 anos
 (Foto: Ricado Saibun/Gazeta Press)
Um dos treinadores que Neymar teve antes de estourar foi Vanderlei Luxemburgo, que não lhe deu a titularidade de vez, como parte da torcida e da imprensa exigiam. Em vez disso, foi introduzindo aos poucos o então aspirante a craque no time principal, o que, hoje, é motivo de piada entre os videntes do passado. Outro treinador ridicularizado pelo mesmo motivo é Osvaldo Oliveira, que tinha nas mãos Gabriel Jesus, que sequer havia estreado entre os profissionais e já era tratado como estrela num Palmeiras pré-Crefisa. Em 2014, Gabriel fez 37 gols em 22 jogos no Campeonato Paulista Sub-17, e destacou-se na campanha do Verdinho no ano anterior na Copinha, quando foi vice-campeão. Como Neymar, Jesus teve que esperar pela chance.
MÁQUINA DE GOLS Gabriel Jesus: estrela antes
 de chegar ao céu (Ross Setford/AP)
Estes são casos de meninos que deitavam e rolavam em cima de moleques da mesma idade e que, com cuidado e preparo, quando enfrentaram os mais velhos, também passaram por cima. Mas foram preparados, curtidos, maturados para isso. E viraram regra quando os apressados argumentam que “o craque já nasce pronto”, essa irritante frase feita que, de antemão, transforma em nada qualquer filosofia de trabalho ou projeto em longo prazo para formação de jogadores de qualidade, como a Alemanha faz. Afinal, se nascem prontos, é só esperar e torcer para que não haja nenhum desvio no caminho para que não saia da rota do sucesso nos gramados.
Pura conversa fiada.
Para cada história de sucesso, há um sem número de fracassos de garotos igualmente talentosos. Jean Chera, por exemplo. Apareceu do nada, ganhou contrato de gente grande no Santos, que arranjou emprego para o pai e o trouxe do Paraná, como fazem os clubes europeus quando querem burlar as normas de transferência de menores de 18 anos da FIFA – Messi é um caso clássico destes, em que o clube oferece emprego para o pai, que se muda de país e leva o filho com ele. Contemporâneo de Neymar, Jean Chera sucumbiu à obrigação de ser craque, muito em função da influência negativa do pai, e não deu em nada, a não ser notícia batida a cada transferência. Como Lulinha, preciosidade das categorias de base do Corinthians e que, por pressão de seu empresário, queimou etapas e, quando foi disputar com jogadores maiores (em todos os sentidos), virou sinônimo de fracasso. Piada repetida a cada história semelhante.


ETERNA PROMESSA Estigma segue Lulinha, craque da
 base que não vingou no profissional (Getty Images)
O ínfimo número de fracassos que ganham notoriedade dão a impressão de que não é algo tão corriqueiro assim. Mas é. De acordo com o estudo A Formação do Jogador de Futebol e sua Relação com a Escola, publicado em 2012, de cada 1000 meninos que sonham em ser jogadores de futebol, três conseguem ingressar na carreira. Destes, somente 3% tornam-se profissionais, sendo que muitos abandonam a carreira logo no início. Se formos pensar nos que ganham notoriedade, então, o corte é infinitamente maior. Só no Brasil, cerca de 800 times são filiados à CBF, com quase 30 mil jogadores profissionais. Destes, 82% ganham menos de R$1.000 por mês, isso quando recebem.
Qual é o apoio psicológico que eles recebem para ter tenacidade ou para lidar com o fracasso? Quantos são preparados para seguirem outros caminhos caso não passem na finíssima malha da peneira do sucesso dos campos de futebol? Quantos respondem bem quando chamados à responsabilidade de resolver as dificuldades do time numa idade em que, em condições justas, estariam no ensino médio, decidindo que caminho trilhar profissionalmente? Quantos têm uma segunda chance, no caso de fracassarem diante da expectativa criada pelo clube, que anseia por um ativo valioso em mãos, pelo agente, que o vê como uma mina de ouro a ser explorada, e até pela família, que deposita neles não raro a única chance real de tirar o pé da lama? Subiu e não correspondeu, amigo? Um abraço! A porta da rua é a serventia da casa.
Vinicius Junior precisa de tempo e compreensão, principalmente se não, como diz o jargão futebolístico, der jogador logo de cara. Inevitavelmente, cairá sobre seus ombros a pressão de ser o craque que provavelmente será se tiver espaço para tentar, errar, aprender e tentar novamente, caso falhe no alto de seus verdes anos. Para diminuir o risco de, em vez de ser como Neymar, ter uma trajetória como a de Jean Chera e virar notícia a cada clube de terceira divisão que vier a defender antes de encerrar a carreira precocemente.   
MENINO PRODÍGIO Jean Chera, com Gabigol e Neymar na base do
Santos: o mais talentoso dos três. O único que não deu jogador
 

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