“Vinicius Junior vai estrear no profissional antes de
Neymar? Fla avalia”. Este é o título da matéria do ótimo Rodrigo Mattos, do
UOL, sobre a mais nova promessa de craque do futebol brasileiro. Vinicius
Junior, a bola da vez, tem 16 anos e idade de juvenil.
Brilhou na Copa São Paulo de Futebol Jr com o seu
Flamengo, clube que orgulha-se da frase “Craque o Flamengo faz em casa”, embora
não tenha feito tantos assim nos últimos anos. Seu brilho na competição durou
enquanto o Rubro-Negro enfrentou catadões de qualidade duvidosa, times de
empresários que empestearam aquela que era para ser a maior e melhor competição
do futebol de base do Brasil, de onde saíram Falcão, Toninho Cerezo, Djalminha,
Dener, Kaká e Neymar, mas hoje é um balcão de negócios dos mais ordinários. No
primeiro obstáculo parrudo, sucumbiu.
Demérito algum para um menino de 16 anos.
Depois veio o Sul-Americano Sub-17, em que foi o
principal destaque do título invicto da Seleção Brasileira e chamou a atenção
de emblemas como Barcelona e Real Madrid, que, é o que se diz, não medirão
esforços pelo garoto, cujo vínculo com o Flamengo vai até 2019 (menores de
idade não podem assinar por mais de três anos e o Flamengo tenta, para julho,
mês de aniversário do jogador, esticar o contrato até 2020).
Leia também:
Sobre retranca, postura. apito e linha burra
Leia também:
Sobre retranca, postura. apito e linha burra
Já existe uma pressão desgraçada para que o time da
Gávea inscreva o garoto nos campeonatos. Dirigentes flamenguistas adotam o
discurso de que já viram histórias de joias que não foram lapidadas e acabaram
se perdendo. Mattos, o jornalista, compara a trajetória dele com a de outro
talento precoce, Neymar, tendo como base a idade de estreia no time principal.
Neymar debutou no time de cima do Santos com 17 anos e um mês.
Um dos treinadores que Neymar teve antes de estourar
foi Vanderlei Luxemburgo, que não lhe deu a titularidade de vez, como parte da
torcida e da imprensa exigiam. Em vez disso, foi introduzindo aos poucos o
então aspirante a craque no time principal, o que, hoje, é motivo de piada
entre os videntes do passado. Outro treinador ridicularizado pelo mesmo motivo
é Osvaldo Oliveira, que tinha nas mãos Gabriel Jesus, que sequer havia estreado
entre os profissionais e já era tratado como estrela num Palmeiras pré-Crefisa.
Em 2014, Gabriel fez 37 gols em 22 jogos no Campeonato Paulista Sub-17, e
destacou-se na campanha do Verdinho no ano anterior na Copinha, quando foi
vice-campeão. Como Neymar, Jesus teve que esperar pela chance.
PRECOCE Neymar já era esperança aos 15 anos (Foto: Ricado Saibun/Gazeta Press) |
MÁQUINA DE GOLS Gabriel Jesus: estrela antes de chegar ao céu (Ross Setford/AP) |
Pura conversa fiada.
Para cada história de sucesso, há um sem número de
fracassos de garotos igualmente talentosos. Jean Chera, por exemplo. Apareceu
do nada, ganhou contrato de gente grande no Santos, que arranjou emprego para o
pai e o trouxe do Paraná, como fazem os clubes europeus quando querem burlar as
normas de transferência de menores de 18 anos da FIFA – Messi é um caso
clássico destes, em que o clube oferece emprego para o pai, que se muda de país
e leva o filho com ele. Contemporâneo de Neymar, Jean Chera sucumbiu à
obrigação de ser craque, muito em função da influência negativa do pai, e não
deu em nada, a não ser notícia batida a cada transferência. Como Lulinha,
preciosidade das categorias de base do Corinthians e que, por pressão de seu
empresário, queimou etapas e, quando foi disputar com jogadores maiores (em
todos os sentidos), virou sinônimo de fracasso. Piada repetida a cada história
semelhante.
ETERNA PROMESSA Estigma segue Lulinha, craque da base que não vingou no profissional (Getty Images) |
O ínfimo número de fracassos que ganham notoriedade
dão a impressão de que não é algo tão corriqueiro assim. Mas é. De acordo com o
estudo A Formação do Jogador de Futebol e sua Relação com a Escola, publicado
em 2012, de cada 1000 meninos que sonham em ser jogadores de futebol, três
conseguem ingressar na carreira. Destes, somente 3% tornam-se profissionais,
sendo que muitos abandonam a carreira logo no início. Se formos pensar nos que
ganham notoriedade, então, o corte é infinitamente maior. Só no Brasil, cerca
de 800 times são filiados à CBF, com quase 30 mil jogadores profissionais.
Destes, 82% ganham menos de R$1.000 por mês, isso quando recebem.
Qual é o apoio psicológico que eles recebem para ter
tenacidade ou para lidar com o fracasso? Quantos são preparados para seguirem
outros caminhos caso não passem na finíssima malha da peneira do sucesso dos campos
de futebol? Quantos respondem bem quando chamados à responsabilidade de
resolver as dificuldades do time numa idade em que, em condições justas,
estariam no ensino médio, decidindo que caminho trilhar profissionalmente?
Quantos têm uma segunda chance, no caso de fracassarem diante da expectativa
criada pelo clube, que anseia por um ativo valioso em mãos, pelo agente, que o
vê como uma mina de ouro a ser explorada, e até pela família, que deposita
neles não raro a única chance real de tirar o pé da lama? Subiu e não
correspondeu, amigo? Um abraço! A porta da rua é a serventia da casa.
Vinicius Junior precisa de tempo e compreensão,
principalmente se não, como diz o jargão futebolístico, der jogador logo de
cara. Inevitavelmente, cairá sobre seus ombros a pressão de ser o craque que
provavelmente será se tiver espaço para tentar, errar, aprender e tentar
novamente, caso falhe no alto de seus verdes anos. Para diminuir o risco de, em
vez de ser como Neymar, ter uma trajetória como a de Jean Chera e virar notícia
a cada clube de terceira divisão que vier a defender antes de encerrar a
carreira precocemente.
MENINO PRODÍGIO Jean Chera, com Gabigol e Neymar na base do Santos: o mais talentoso dos três. O único que não deu jogador |
Sem comentários:
Enviar um comentário