Há alguns anos, o Senado Federal, casa outrora ocupada apenas por pessoas de reputação ilibada, era presidido pelo senador alagoano Renan Calheiros. Renan fora Ministro da Justiça durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Ele, Calheiros, é um dos fundadores do PSDB, opositor ferrenho do governo Lula e, agora, de Dilma Roussef, e de tantos outros que vierem do PT.
José Sarney, por sua vez, era membro da Aliança Renovadora Nacional, ARENA, partido criado durante a década de 1960 para dar sustentação à ditadura militar, e chegou à sua presidência. No fim da década seguinte, a ARENA virou o PDS (atual PP, o partido do Maluf), que rachou durante o processo de sucessão do presidente Figueiredo.
Renan Calheiros foi um dos mentores da candidatura de Fernando Collor à presidência, de quem era opositor em Maceió. Sarney era o presidente da República, cargo que herdou com a morte de Tancredo Neves, eleito pelo colégio eleitoral. Tancredo precisou dos votos dos dissidentes do PDS para derrotar Maluf, e foi aí que Sarney embarcou.
O alagoano chegou à presidência do Senado, cargo que ocupou até renunciar em 2007, devido a denúncias de que tinha contas pessoais pagas por um lobista ligado a empreiteiras. Sarney, por sua vez, foi acusado de promover uma série de medidas no mínimo questionáveis, os chamados "Atos Secretos", que não resultaram em absolutamente nada. Sarney contou com a blindagem do governo federal. Tudo em nome da governabilidade "deste país".
Hoje, primeiro dia de fevereiro, mês do Carnaval, Renan é reconduzido à presidência da casa, sucedendo José Sarney. Em seu discurso de posse, elogiou o bigodudo antecessor, a quem se referiu como condutor do país no processo de redemocratização. Para ele, Sarney promoveu a transparência na política nacional e o fim da censura. Para quem não sabe, o jornal O Estado de São Paulo está proibido de divulgar fatos sobre a operação Boi Barrica, que tem como um dos investigados Fernando Sarney, primogênito do velho Sarney, o arauto da moralidade e da transparência.
É grave? Sim, é muito grave. O Senado Federal, assim, será presidido por alguém que está sob suspeita de corrupção, e isso é público e notório, tanto que o PMDB, seu partido, só anunciou sua candidatura um dia antes da eleição, para evitar o desgaste do agora presidente e segundo nome na linha sucessória da presidente Dilma, logo abaixo do vice-presidente Michel Temer, também do PDMB, não por acaso partido de Sarney.
Se antes havia a necessidade se ser honesto, hoje nem é preciso ao menos parecer. Faz-se tudo sob a luz, já que ninguém liga mesmo. É como disse o senador pedetista Cristovam Buarque: "Já havíamos perdido o poder; agora, perdemos o pudor". Mas tudo bem, em fevereiro tem Carnaval.
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