IMPASSE Jogadores cumprimentam torcedores antes do jogo que não houve. Equipes peitaram a Federação (Cléber Yamaguchi/AGIF) |
Que o clássico Atletiba, pelo Campeonato Paranaense, não
aconteceu é sabido por toda a malta. O motivo, também já levado a público, foi
a decisão dos clubes de, sem acerto quanto à cessão dos direitos de transmissão
de seus jogos com qualquer emissora de TV, transmitirem pelos seus canais
oficiais no Youtube e nas respectivas fanpages no Facebook, o que levou a
Federação Paranaense de Futebol a proibir o início a partida já com os times em
campo e após a execução dos hinos Nacional e do estado do Paraná.
Seria uma revolução na forma de não só fazer, mas de vender,
no melhor sentido da palavra, o futebol brasileiro, o que, evidentemente, mexe
com o chamado status quo vigente no país.
Contextualizando:
A Lei Pelé, no artigo 42, versa que “o direito de
transmissão e retransmissão por qualquer meio do espetáculo desportivo pertence
à entidade de prática desportiva, ou seja, os clubes, que podem negociar com
quem e da forma que quiserem.” Quem diz é o Professor Dr. João Chiminazzo,
especialista em Direito Desportivo. “Uma vez que os clubes, no caso Atlético e
Coritiba, não cederam para ninguém, poderiam ter tocado a empreitada de eles
mesmos fazerem a transmissão”, segue.
A última posição da Federação, depois de tanto diz-que-diz,
é que os repórteres que trabalhariam na partida não estariam credenciados.
Conversa mole, pois eles tinham crachás de identificação e estavam já no
gramado, lugar onde só tem acesso quem faz parte do espetáculo e, portanto, não
se entra sem autorização, o que torna a tese estranha, para dizer o mínimo.
Outra hipótese é a de que o quarto árbitro, Rafael Traci, teria dito que
“equipe de Youtube não é a detentora do campeonato” e que a ordem de impedir o
início do jogo partiu do presidente da Federação, Hélio Cury.
Tudo isso momentos antes do jogo, como já foi dito aqui.
Qualquer que tenha sido o motivo, a Federação Paranaense de
Futebol agiu de forma arbitrária. Interferiu numa seara que não era sua e
desrespeitou a lei para defender interesses que não eram os dos seus filiados.
Inclusive, o ocorrido levanta uma questão que já deveria ser feita há muito
tempo: para que serve as federações?
Ou, se preferir, a quem servem as federações?
Os clubes são reféns do que é decidido nas salas das
entidades que organizam as competições. Em 2012, o Guarani teve que abrir mão
de jogar no seu Brinco de Ouro na decisão contra o fortíssimo Santos de Neymar
e Ganso. Em 2015, quando o Flamengo e Fluminense resolveram peitar a Ferj,
arbitragens no mínimo estranhas e decisões discutíveis nos tribunais
facilitaram o acesso de Vasco e Botafogo à decisão do estadual.
Quando os clubes tiveram a chance de tirar da CBF toda a
escumalha que está lá desde Ricardo Teixeira, elegeram para vice-presidente da
Região Sudeste o Coronel Nunes, presidente da Federação Paraense há mais de 25
anos e aliado de Marco Polo Del Nero, então afastado da presidência da CBF.
Foi, como também é sabido, uma manobra para que, caso Del Nero renunciasse, o
comando do futebol nacional seguisse nas mãos do grupelho, já que o estatuto da
entidade previa que o vice-presidente mais velho assumiria na tal vacância do
cargo.
Uma solução seria a criação de uma liga nacional, o que
deixaria para os clubes a realização das competições e, para a CBF, ficaria o
que fosse referente à Seleção Brasileira, o que acontece nos principais países
europeus. Mas isso é inviável a partir do momento em que os próprios clubes
olham apenas para o próprio umbigo e, do co-irmão, querem apenas as vísceras.
A Primeira Liga é um bom exemplo disso. Enfraquecida logo no
berço pelo desentendimento dos clubes para definirem cotas de participação e
pela falta de aval da CBF, que contrariou mais uma vez a Lei Pelé, e sem o
dinheiro que esperava receber da TV pelos direitos da competição – que
colocaria em campo os principais clubes do Rio de Janeiro (exceto Vasco e
Botafogo, fiéis à Ferj), Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa
Catarina – a Primeira Liga acertou os ponteiros e divulgou tudo: clubes,
tabela, forma de competição.
Eis que a semana da estreia chegou e, faltando três dias
apenas para que começasse o torneio que representaria a modernidade do futebol
nacional, a CBF do Coronel Nunes resolveu vetar sua realização, se baseando,
entre outras justificativas, no Estatuto do Torcedor e no descumprimento do
intervalo mínimo entre as partidas a serem disputadas pelos jogadores.
O mesmo Estatuto do Torcedor foi rasgado quando a Portuguesa
foi rebaixada via tapetão para a Série B do Campeonato Brasileiro. Aqui, não
faço juízo de valor, mas destaco que uma lei federal, o Estatuto do Torcedor,
ficou subordinada a uma regulamentação específica, o Regulamento Geral de
Competições da CBF. Quanto às tais 72 horas que devem haver entre uma parida e
outra, não é difícil de encontrar casos (aos montes) em que os jogadores
voltaram a campo antes do prazo mínimo estabelecido, e pelo qual os próprios
sindicatos de jogadores, entidades igualmente questionáveis, não dão a mínima.
Mandando onde não deveriam, as federações fazem o lhes convêm
e respeitam as leis somente quando estas lhes interessam. Em via de regra,
falta coragem aos clubes, o que, a priori, não é o caso dos dirigentes de
Atlético Paranaense e Coritiba.
A priori.
Os
principais distintivos brasileiros, estes sim com poder de barganhar, precisam
parar de olhar para seu próprio umbigo e se unirem pelo bem maior, que é o
próprio futebol, e darem uma banana à CBF e às obsoletas e parasitárias
federações estaduais, mas aí é pedir demais aos “modernos” cartolas
brasileiros. Tudo normal para o “Padrão-Brasil”, o país projetado para dar
errado.
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