quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Sobre embalagem, estatísticas e biquíni

COMEÇO RUIM Rogério demonstra desânimo na
lateral do campo (Marcello Zambrana/AGIF)
Após o jogo de estreia de Rogério Ceni como treinador do São Paulo, quando o Tricolor foi atropelado pelo Audax por 4 a 2, o ex-camisa 01 e agora técnico amenizou o resultado ao destacar o número de finalizações e a posse de bola da sua equipe. O São Paulo teve, segundo dados publicados pelo Footstats, 55% de posse de bola, além de finalizar 27 vezes, 10 delas no gol defendido pelo goleiro Felipe Alves.

O discurso é bonito e se encaixa perfeitamente no que tem acontecido com frequência para embasar sistemas de jogo e atuações: números, números e números. Mas dá para justificar apoiado somente nesses dados? Sim, todos fazem isso, mas Rogério representa, ou deveria representar, o novo. Tem dois auxiliares europeus, vendeu a ideia de ter realizado treinos diferentes em todos os dias na pré-temporada realizada nos Estado Unidos, passou o ano estudando na Europa absorvendo conceitos de técnicos como Carlos Ancelotti. Garantia de sucesso?

Nenhuma.   

Para começar, ele não levou em consideração se a posse de bola, que nem foi tão superior assim, foi objetiva ou vertical. Se, como gostam de falar os novos analistas, rompeu as linhas adversárias, se foi mais que uma simples e infrutífera troca de passes no campo de defesa, de lateral a lateral, passando antes pelos dois zagueiros ou então pelo volante, que retorna a bola para o centro da zaga antes de ela ser passada para o lateral. Ou quantas dessas finalizações foram realmente chances claras de gol?

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Vitor Guedes, jornalista com J em caixa alta, citou na sua ótima Caneladas do Vitão, no jornal Agora, a célebre frase do economista Roberto Campos  sobre estatísticas: "o que revelam é interessante, mas o que ocultam é essencial". E o que querem dizer os números trazidos por Ceni para a coletiva?

Um grande nada. 

Rogério quis inovar, colocando Rodrigo Caio, seu beque disparadamente mais técnico, à frente dos zagueiros Douglas e Maicon, desmontando o único setor do time que não comprometeu no medonha temporada de 2016. No fim, com o placar adverso, apelou para a velha tática da absoluta falta de tática (também conhecida como desespero) do centroavante enfiado no meio dos zagueiros e fosse o que Deus quisesse.

Pouco para quem chegou com a expectativa de ser o diferente.

Certamente, um dos livros lidos pelo agora treineiro tricolor é o Guardiola Confidencial, do espanhol Marti Perarnau. Nele, o autor fala o quanto Guardiola detestava quando o time do Bayern passava a bola de pé em pé, horizontalmente, no campo de defesa. E que a posse de bola somente pela posse de bola não serve para nada. "É uma merda", diz Pep em diversas passagens.

Não adianta acharem que bastam alguns dias para que Rogério apresente algo novo. Ou que a presença de europeus, coisa que nós da imprensa já vamos gorjeando como a única maneira de modernizar o que acontece nos gramados daqui, transforme do dia para a noite o futebol brasileiro. 

Não é.

A excelência (termo que Guardiola também abomina) do trabalho depende de fatores como filosofia, método, treinamento e tempo. Sem isso, o projeto, se é que há, vira passageiro da própria sorte. Basta saber se ele será, como o genial catalão, um agente da contracultura futebolística brasileira e terá tempo para desenvolver seu trabalho. Sem contar que não quer dizer absolutamente nada o fato de ele ter sido um grande atleta, o dono do vestiário por anos, ter vestido a camisa tricolor por mais de 20 anos. Muda-se a função, as responsabilidades são outras, as decisões a serem tomadas também, e a história escrita é apenas isso: história.  

Entre tanta mediocridade e falta de projetos alicerçados nos fatores mencionados, algo que tanto atrasa o futebol tupiniquim, espera-se que Rogério Ceni seja mais do que uma embalagem diferente. Afinal, de "m1to" do gol para burro do banco de reservas, basta apenas um passo. Ou uma sucessão de resultados ruins.       

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